Relembrei meu grande amor assim que passei pela esquina que sempre me conduz de volta para casa. Ela, diferente daquelas mulheres que tantas vezes desamparadas buscam na noite o sustento de suas vidas tinha em mim todo o meu amor, minha atenção e a minha compreensão. Ela era íntima de minhas angústias, decepções e pequenas alegrias. E partiu súbita, como quem é lançado às alturas. Pensei naquela linda morena que frequentava minha vida e que escapou do laço que envolvia meu coração. Aquele corpo esguio insiste em permanecer na minha lembrança. Sua beleza simples me enlouquecia; seus trejeitos, sua ternura, sua boa vontade comigo e com todos ao redor. Estou sem chão. Sem perspectivas. Todas as noites, em meu quarto, contemplo as estrelas à procura da mais cintilante. E então, quando o silêncio se instala como um véu de veludo sobre o mundo, sinto sua ausência pulsar dentro de mim suave e cruel, como um sopro de vento que conhece todos os meus segredos. Cada estrela parece guardar um fragmento seu, um brilho que recorda a maciez do seu olhar e a delicadeza do seu sorriso derramado sobre minha existência. Caminho entre memórias como quem atravessa um jardim depois da chuva: tudo cheira a passado, tudo reluz o que já foi e nada posso tocar. A saudade me visita com passos leves, porém certeiros, e se instala em mim como moradora eterna. Às vezes quase escuto sua risada atravessando a noite, confundindo-se com o canto distante de um pássaro adormecido. Se ao menos eu pudesse recolher seus rastros pelo vento, reconstruir sua presença com as lembranças que ainda tremeluzem em mim, talvez meu coração encontrasse descanso. Mas o destino escultor implacável, moldou entre nós um abismo que nem o tempo ousa preencher. Assim permaneço: metade ser, metade saudade. E espero que a estrela mais brilhante àquela que busco todas as noites não me reconduza você, mas me devolva a mim mesmo, para que eu possa seguir, mesmo sem o sol que um dia atendi pelo seu nome. Preciso, enfim, desembaraçar a teia de ilusões que se fez da minha vida.
domingo, 16 de novembro de 2025
sábado, 15 de novembro de 2025
Brilhos que desabrocham o olhar.
É com brilho no olhar que vejo mais um dia chegar. Você se aproximar e se aconchegar. Resoluta em seus pensamentos encosta a cabeça em meus ombros, onde ouço seu coração palpitar num pedido silencioso por mais amor, além de todo o esforço que dedico em tê-la mesmo que por instantes breves, porém intensos. Sei que nosso sangue é um só: vermelho de intimidades profundas, tingido pelos dias vividos lado a lado. Nossos perfis, por mais incrível que pareça, são homogêneos. Caminhamos na mesma sintonia, gostamos do que nos envolve e sempre compartilhamos olhares que dizem o que palavras não alcançam. Até as rosas, as rainhas das paixões parecem abaixar sua bela figura quando passamos por esse imenso jardim de amor, testemunha silenciosa do que floresce entre nós. E assim seguimos, guiados por sentimentos profundos que brilham no olhar, no toque, no coração.
sexta-feira, 14 de novembro de 2025
Por você, sempre por você.
Há um dia em que a gente se cansa. Esgota de tentar caber, de agradar, de provar. Extenua de medir o próprio valor pela régua dos outros. E é nesse instante silencioso, quando o peito dói, mas a alma desperta, é que a gente entende: talvez seja hora de fazer as coisas por si mesmo. Eu me lembro de um dia em que percebi isso. Estava diante do espelho, sem maquiagem, com olheiras fundas e o cabelo preso de qualquer jeito, quase da forma maltrapilha. Por um momento, vi alguém que eu quase não reconhecia. Não porque eu tivesse mudado tanto, mas porque fazia tempo que não me olhava de verdade. Passei anos tentando corresponder às minhas expectativas, aos padrões, aos olhares. Mas ali, naquela manhã qualquer, entendi que o amor que eu esperava receber dos outros precisava, antes, nascer em mim. Foi quando decidi estudar por mim. Não mais para ser um exemplar, nem para ter um diploma que impressionasse pessoas. Mas porque aprender me faz sentir viva. Porque há algo profundamente libertador em entender o mundo, em questionar, em pensar por conta própria. O conhecimento é um tipo de amor silencioso. Ele nos segura quando tudo desaba, nos sustenta quando ninguém mais entende. Acompanha-nos quando o resto vai embora. Depois veio o corpo. Por muito tempo, eu malhei por culpa. Por não gostar do que via, por querer mudar o que o espelho refletia. Hoje, malho por gratidão. Porque meu corpo me carrega, me sustenta me leva onde a vida pede. Sinto o coração acelerando, o suor escorrendo, e percebo: é assim que eu me dou amor. Não é castigo. É cuidado. E então aprendi a me arrumar por mim. Colocar uma roupa bonita, um perfume leve, não para ser observada, mas, para me ver. Há dias em que isso parece banal, mas é nesses detalhes que a gente se reconstrói. É quando o espelho devolve o olhar e você finalmente pensa: “eu gosto de quem estou me tornando”. Mudar também virou parte do processo. Por muito tempo, temi mudar. Achava que isso significava perder algo. Mas descobri que mudar é, na verdade, se reencontrar. Cada versão que deixei para trás foi necessária para que eu chegasse até aqui. Mudar por mim é escolher crescer, mesmo que doa. É respeitar o que o coração pede, mesmo que ninguém entenda. É saber que o amor-próprio, às vezes, vem disfarçado de recomeço. Hoje entendo que nada disso é sobre egoísmo. É sobre amor. Amor que não depende, não implora, não se mede por likes ou aprovações. É o tipo de amor que me faz caminhar com firmeza, mesmo quando o chão é incerto. O tipo que me faz olhar para o espelho e sorrir mas não porque está tudo perfeito, mas porque, finalmente, é você quem está ali. E se um dia me perguntarem o que aprendi com tudo isso, direi apenas: faça por você. Estude, malhe, se arrume, mude, mas sempre por você. Porque quando você escolhe se amar, o mundo inteiro muda de forma. E pela primeira vez, a vida começa a ter o seu rosto.
quarta-feira, 12 de novembro de 2025
Nos caminhos da harmonia.
Parece que foi ontem! Os primeiros dez anos de casamento foram um campo de provas: dias difíceis esperanças teimosas e o desejo de acertar. Éramos jovens, cheios de planos e horizontes, acreditando que o amor bastava para sustentar o mundo. Vieram os filhos. Praticamente dois, quase juntos, e, com eles, a pressa de crescer. Entre fraldas e noites curtas, aprendi a linguagem silenciosa do sacrifício, essa arte de abrir mão de si para ver os outros florescerem. Com o tempo, os laços se transformaram. E quando a poeira da juventude assentou, pude ver melhor a mulher ao meu lado: guerreira, paciente, incansável. Ela lutou sem escudos, mas com o coração aberto, e venceu, juntamente comigo. Quis aliviar-lhe o fardo. Contratei ajudantes, mãos generosas que dividiram as tarefas do lar. Residíamos em uma casa confortável, onde a felicidade parecia morar entre as risadas das crianças e o cheiro do café ao entardecer. Hoje, ao revisitar essas memórias, percebo que nenhum esforço foi em vão. A mulher é o alicerce invisível de uma casa, o sopro que mantém acesa a chama da família. Aprendi que viver em harmonia é aceitar o sol e a sombra, a alegria e o erro. Porque o amor verdadeiro não é feito de perfeição. É tecido de paciência, coragem e perdão. E é nesse tecido que a vida, enfim, se sustenta.
sábado, 8 de novembro de 2025
domingo, 2 de novembro de 2025
Entre o jardim e a saudade.
Um vulto amado me fez recordar antigos momentos, no meu jardim. Lá, sentado e absorto em meus pensamentos, com tristezas e dor, lembro-me das emoções incontidas. Reprimidas em feridas por palavras por nós proferidas. Seu sorriso, que outrora animava meus dias, como seus olhos que clareavam minha estrada, já não existe. Sou como um barco sem tripulação, navegando à deriva, sem norte e sem farol em águas turbulentas. A saudade invade meus dias desde aquele adeus inesperado que me deixou sem chão. Feliz daquele que sabe sofrer sem partilhar a outros suas decepções amorosas. Tento afogar minhas saudades, mas não consigo. Após cada porre, a dor aumenta ainda mais. Em solidão e tristeza, o meu retrato é o vazio causado pela sua ausência. O sol raiou e senti gotículas da noite caindo sobre mim. Talvez seja a ventania que trouxe para mim o eco distante da sua voz, murmurando lembranças que o tempo não levou. Fecho os olhos e quase posso sentir o toque leve das suas mãos, como uma promessa que insiste em não morrer. E assim sigo, entre o sonho e a saudade, cultivando no silêncio do meu jardim as flores que um dia plantei contigo. Algumas murcharam, outras resistem como o amor que ainda vive, mesmo em meio às cinzas do que fomos quando nós éramos apaixonados em corações exultantes.
As emoções ocultas reveladas por um simples gesto.
Um simples aperto de mãos. Nada mais, nada menos que isso. Um gesto cotidiano, rotineiro, quase automático. No entanto, naquele instante em que minha mão pousou sobre a sua algo diferente aconteceu. Senti, através do frio que emanava da sua pele, uma corrente de emoções que nenhuma palavra conseguiria traduzir. Havia medo ali, uma ansiedade quase palpável, um desconforto que não se disfarçava, mesmo que você tentasse esconder por trás de um sorriso breve e forçado. Seus dedos tremiam levemente, e esse tremor dizia mais do que qualquer confissão. Era como se sua alma, por descuido ou exaustão, tivesse escapado por entre os poros e se revelado em silêncio. Por um momento, o tempo pareceu desacelerar, e o simples toque se transformou em um elo invisível, uma conversa muda entre duas presenças que se reconheciam pela vulnerabilidade. Olhei em seus olhos e vi o reflexo de algo que conhecia bem, o medo de ser lido, o receio de se despir emocionalmente diante de alguém. Mas, ao mesmo tempo, havia um pedido implícito, um grito contido por compreensão, como se o toque dissesse: “Perceba-me! Mesmo que eu não saiba como dizer o que sinto!” Soltei sua mão devagar, respeitando o silêncio que se formou entre nós. Ainda sentia o frio preso à minha pele, como se um pedaço do seu medo tivesse se agarrado a mim. E foi nesse instante que eu compreendi a razão pela qual as emoções humanas são mais sinceras quando não precisam de palavras. O corpo fala com uma verdade que o discurso não alcança. Às vezes, basta um gesto, um olhar, um toque, um aperto de mãos, para que a alma se revele inteira. E é nesse instante breve, quase imperceptível, que descobrimos que os sentimentos mais profundos não só gritam. Sussurram também aos ouvidos como simétricas conexões.
quinta-feira, 30 de outubro de 2025
Ladrão de sonhos
E o mundo real, enfim, tem sua paz.
Eu fecho os olhos, me entrego ao cansaço. Mas sinto que invade um outro espaço. Não sei de quem roubo a tranquila noite. Mas pressinto que em mim a vida do outro flui. O sono que me embala, leve e sereno, é a vigília de alguém, triste e pequeno. Em meus sonhos, visões que não me pertencem. De vidas estranhas que me parecem. Lágrimas que não chorei, sorrisos alheios. Ecos de um desejo que não é dos meus anseios. Será que meu peso é demais para um só? Será que a vida, me cobra um preço maior? Será que a minha paz rouba a serenidade de alguém distante, num ciclo invisível, cruel e constante? E ao acordar, o alívio se mistura à dor e resignação. De saber que vivi a fantasia de outro ser. Que a minha noite foi a insônia de alguém. E a cada amanhecer me pergunto: de quem? Sabedor que à noite, roubarei outra vez.
terça-feira, 28 de outubro de 2025
O elo invisível dos corações sinceros.
Fidelidade é o sopro leve que sustenta o amor nas horas frias. É a chama pequena que não se apaga, mesmo quando o ar sopra forte. É o gesto simples que repete o cuidado, a escolha silenciosa que se renova a cada amanhecer. Ser fiel é permanecer quando seria mais fácil partir. É acreditar no vínculo mesmo quando o mundo duvida. É guardar o nome do outro como promessa. É respeitar o espaço sem perder o laço. Lealdade é raiz e é asa. Raiz que firma, asa que liberta. Pois quem é fiel não prende acompanha o voo com confiança. Há deferência nas palavras que cumprem o que dizem, nos olhos que não se desviam da verdade, das posturas e da sinceridade, no abraço que permanece igual, mesmo quando o tempo muda tudo ao redor. Ser fiel é amar sem precisar vigiar. É confiar sem medo da distância. É saber que o coração tem endereço certo, ainda que os caminhos se alonguem. E no fim, a consideração é espelho da alma: reflete quem somos quando ninguém nos vê. É a poesia que o tempo escreve em silêncio, a eternidade escondida nos gestos simples. Porque ser fiel é ser inteiro. E o que é inteiro, o tempo não quebra. O que é fiel, o mundo não apaga. No som, o original é a gravação. A alta fidelidade busca a reprodução perfeita e sem distorções do som. No amor, o original é o compromisso ou a promessa de exclusividade e união. O zelo e a atitude que mantém esse compromisso inalterado são puros.
A flor da esperança.
Pode sorrir à vontade. O seu sorriso já não me desarma como antes, mas ainda ilumina o canto mais secreto das minhas lembranças. Há algo em ti que o tempo não conseguiu levar: a essência que um dia me fez acreditar que o amor podia ser abrigo e tempestade ao mesmo tempo. No entanto, hoje, aprendi a olhar para esse sorriso sem me perder, porque no meu jardim viceja forte, teimosa, bela, a flor do desejo. Essa flor nasceu das ruínas. Brotou entre as pedras do meu ego silencioso, entre as ausências que gritavam quando seu nome já não se ouvia. Eu cuidei dela com as mãos feridas e reguei-a com lágrimas escondidas que já não eram de dor, mas de renascimento. E foi assim que compreendi: o amor, quando amadurece, não implora permanência ele floresce, mesmo quando outra parceria se desfaz. Tu e eu formamos um lindo par, e disso não me envergonho. Houve em nós um fogo que iluminou noites e cegou dias. Fomos intensidade, verdade e entrega. Mas a beleza de um jardim não está em prender o vento, mas em deixá-lo soprar e ver o que resiste depois da ventania. E o que resistiu, dentro de mim, foi essa força mansa que aprendi a chamar de esperança. A sua fascinação ainda persiste no meu coração, é verdade. Ela mora nas entrelinhas do que fui às lembranças que às vezes me visitam quando a noite é longa. Mas já não me fere; hoje, é lembrança doce, não ferida aberta. Porque o coração que um dia te ofertou paz e segurança agora oferece isso a si mesmo. Descobri que a paz não está em quem fica nem em quem vai. Está em quem aprende a florir, mesmo só. A segurança não vem do abraço alheio, mas da certeza de que posso caminhar com os meus próprios passos, sem deixar de acreditar no amor. O meu jardim segue vivo. Nele, cada pétala guarda um pedaço da nossa história, mas também o perfume de tudo o que ainda está por vir. São essências de sentimentos e apegos. A flor da inspiração fascina e cresce firme, entre memórias e recomeços, porque ela aprendeu como eu, que o amor verdadeiro nunca morre. Ele se transforma. E se um dia passares por esse jardim novamente, talvez sintas o mesmo perfume de antes. Mas não te enganes, não é saudade que paira no ar. É força. É vida. É a prova de que, mesmo depois do adeus, a confiança continua a vicejar, altiva, no meu peito.
domingo, 26 de outubro de 2025
O relógio que o tempo não consome.
Encontrei lá no fundo do roupeiro, perdido entre quinquilharias esquecidas, o meu antigo relógio analógico da marca Mido. Foi como reencontrar um velho amigo que o tempo afastou, mas nunca apagou da lembrança. O metal já sem o mesmo brilho, a pulseira ligeiramente marcada pelos anos que, no entanto, bastou tocá-lo para que algo dentro de mim voltasse a pulsar. Esse relógio sempre foi mais do que um simples medidor de horas. Era uma espécie de companheiro silencioso, testemunha dos meus dias, dos atrasos e das pressas que me acompanhavam. Havia nele uma mania ou talvez uma teimosia que eu mesmo inventei: todos os dias, quase por instinto, atrasava os ponteiros alguns minutos. Não sei se era medo de chegar cedo demais às coisas ou vontade de enganar o tempo. Talvez fosse só uma forma de dizer que ele não mandava em mim. Lembro-me bem da transição que os anos trouxeram. Na década de setenta, o Brasil começou a ser invadido pelos relógios digitais, símbolo de uma modernidade que se anunciava com números brilhantes e sons metálicos. As vitrines pareciam prometer um futuro mais preciso e mais veloz, e também mais eficiente. Aos poucos, o velho Mido foi sendo deixado de lado. Primeiramente passou a dormir na cabeceira da cama, depois a repousar em alguma gaveta. O mundo girava mais rápido, e eu, sem perceber, fui deixando que o tempo me ultrapassasse. Hoje, ao encontrá-lo, percebo que o relógio ainda carrega os segundos com a mesma dignidade de antes. Não importa se parou se já não funciona como antes. Ele continua sendo o símbolo de uma época em que o tempo parecia mais humano, mais elástico, mais nosso. Há uma ternura em seu silêncio, uma fidelidade que as máquinas modernas jamais conhecerão. E talvez por isso eu tenha feito um pedido: que, quando chegar minha hora, apesar de meu ceticismo, que coloquem o Mido junto a mim, dentro do esquife. Não por vaidade, nem por apego material, mas por reconhecimento. Porque ele foi, durante tantos anos, o companheiro que marcou meus dias, o cúmplice das minhas pequenas rebeldias contra o relógio da vida. Sei que o meu corpo, como tudo o que é vivo, será um dia devorado pela terra. Mas o meu relógio? Ah, esse jamais será “coMIDO”. Ele continuará de algum modo, resistindo. Porque há objetos que não morrem. Guardam em si a alma de quem os usou, o rastro das horas que viveram juntos. No fim, compreendo que o tempo não é inimigo, mas espelho. Ele apenas reflete o que fomos capazes de viver nem mais, nem menos. Os ponteiros do Mido talvez tenham parado, mas dentro de mim ainda giram, lembrando que cada segundo teve um propósito, cada atraso uma história, cada batida uma presença. E talvez seja isso a eternidade: não o tempo que continua, mas o instante que permanece em gravações de lembranças.
sexta-feira, 24 de outubro de 2025
Marcas no horizonte.
Fitando o horizonte as marcas do teu passo. Não é miragem, não são as impressões descalças na areia. Essas se perdem nas pequenas ondas do mar. Esse sentimento de perda em te ires para sempre deixou meu coração desalinhado como figura geométrica em alto relevo fora de foco. Mas ainda assim caminho, mesmo que em desordem, tropeçando nas lembranças que o vento e o mar insistem em devolver à minha paz. Há algo de permanente no efêmero. Uma cicatriz suave no tempo, onde o toque da tua ausência repousa. Tento redesenhar o contorno do teu rastro no ar, como quem desenha o invisível com os dedos, procurando no vazio o eco de um sorriso antigo. As horas passam lentas, como se o relógio também lamentasse. O horizonte, antes promessa, agora é linha de despedida. E eu, aprendiz de solidão, aprendo a seguir sem apagar o que ficou. Porque há passos que, mesmo quando o mar apaga, permanecem. Não na areia, mas na memória do coração que, aos poucos, tenta se realinhar novamente, ainda que torto, ainda que teu. Recolho as lembranças com o cuidado de quem recolhe conchas na beira do mar. E uma delas guarda um som, um instante, uma forma de existir que o vento não levou por completo. Aprendo, aos poucos, que há perdas que não se superam: apenas se transformam em silêncio, em calma, em gesto de seguir adiante e sem despedidas.
terça-feira, 21 de outubro de 2025
A rosa e a minha dor.
A rosa é um símbolo da beleza que transcende a dor. Ela cresce delicada e intensa, mesmo no terreno mais árido, refletindo a capacidade de florescer apesar dos desafios da vida. Cada pétala parece carregar consigo a suavidade da esperança, enquanto seus espinhos, embora pungentes, são um lembrete de que a dor e a beleza coexistem. Ela não é apenas uma flor, é um reflexo do nosso ser das nossas cicatrizes, das nossas fragilidades e das nossas forças, inclusive as emocionais. E é nesse campo fértil, onde a dor tenta se enraizar, que a rosa se ergue, trazendo consigo uma promessa. No canto qualquer do meu coração, onde a saudade se esconde, o amor deve chegar como diz a letra de uma linda canção. Não como uma luz ofuscante, mas como um perfume suave que preenche os espaços vazios, aquecendo a alma, dissolvendo as sombras. O amor, embora tímido e distante, sempre encontra um caminho para chegar, ainda que seja necessário atravessar as tempestades. Quando olho para a minha flor, percebo que, às vezes, a dor que sinto não é a única verdade em minha vida. Há algo mais, algo que brilha, ainda que as sombras me envolvam. A rosa é como um sinal de que, por mais difícil que seja sempre há algo precioso a ser encontrado, uma beleza que vale mais que qualquer sofrimento, uma razão para seguir adiante. Ela é a representação da resiliência, do amor que floresce até nas condições mais desafiadoras, e, acima de tudo, é a promessa de que, por mais forte que seja a dor, sempre há algo em nossa jornada que vale a pena. E, talvez, isso seja o que nos mantém vivos e buscando, em meio ao caos, um motivo para continuar um amor que, no fim, sempre encontra seu lugar, mesmo que escondido num canto qualquer do coração.
domingo, 19 de outubro de 2025
Liberdade! Uma palavra inegociável.
Ser livre é mais do que caminhar sem correntes. É respirar o próprio destino,é abrir as asas do espírito e permitir-se ser. Liberdade é sentir o mundo dentro de si, é ouvir o chamado da alma e seguir, mesmo que o caminho seja incerto. Ela nasce do encontro com a verdade, do gesto digno do coração que não se curva diante da injustiça ou do medo. É o grito silencioso de quem ousa sonhar, de quem acredita que o bem pode florescermesmo no solo árido da dor. Há aqueles que fazem da vida um ato de resistência, que transformam o amor em força, e a compaixão em revolução. São almas luminosas que lutam por um mundo melhor, onde o respeito e a dignidade sejam a regra, e não a exceção. São os construtores de um futuro mais humano, aqueles que compreendem que ser livre é também desejar a liberdade de todos. Mas a liberdade vai além do sentimento humano ela pulsa em toda forma de vida. Há quem, com boas intenções, aprisione seus animais, achando proteger, quando na verdade os limita. Cães e gatos que olham o céu pelas frestas, aves que nunca sentiram o vento de verdade, vidas contidas em espaços pequenos, sem contato com outros animais, para explorarem e sentirem o mundo. Liberdade não é luxo é necessidade vital, de homens, de bichos, de tudo o que respira e sente. A verdadeira liberdade é generosa: não se contenta em ser apenas individual. Ela se multiplica no olhar, no gesto, no amor compartilhado. Nasce então a gratidão por estar vivo, por poder escolher, por aprender com cada ser que divide o caminho. Ser livre é reconhecer o milagre de existir. É erguer-se diante das quedas e agradecer, mesmo em meio ao caos, pela chance de recomeçar. A liberdade é o sopro da vida. A gratidão, o perfume que ela deixa ao passar em nossas vivências. Eu vejo isso de perto quando abro a porta de entrada da minha casa em Praia Seca RJ, os canários da terra em cantos que em revoada amarelas dispersam-se em lindos sons de canto. Nada melhor do que a liberdade!
quinta-feira, 2 de outubro de 2025
Beijo que desata silêncios.
Na curva do lábio onde o silêncio adormece, há noites inteiras que pedem calor. Palavras trêmulas, nunca ditas, desejos guardados no sabor do pudor. A boca dela — pétala e segredo - grita em silêncio, geme em sonho. Carrega o peso de vontades contidas, e a sede antiga de um toque risonho. Sufocar essa solidão, não com pressa, nem com posse, mas com um beijo que saiba escutar, com mãos que leiam sua pele, com olhos que saibam ficar. É chegar sem romper, desatar os nós com carinho, respeitar o tempo do corpo e incendiar o caminho. Porque nem todo toque é encontro, mas há beijos que acendem o que antes dormia e devolvem à boca a alegria. Beijo que desata silêncios não é urgência é presença. É arte de amar com paciência.
quinta-feira, 18 de setembro de 2025
Entre certezas e incertezas
Não sei de onde ela veio, nem para onde vai. Sua presença foi como a de um cometa que, de repente, cruzou o céu da minha vida, iluminando-a com sua intensidade, para logo em seguida desaparecer na vastidão do desconhecido. Nos envolvemos virtualmente, uma conexão que se teceu através das palavras digitadas, os sons das mensagens de áudio e, esporadicamente, a voz através da linha telefônica. Uma relação marcada pela efemeridade, como tudo que se constrói nas redes invisíveis do mundo digital. A cada conversa, ela se abria mais, e eu, de alguma forma, sabia escutar. Ela dizia que minha voz acalmava seu coração, e de certo modo, eu acreditava que sua confiança em mim era algo raro e precioso. Mas, ao mesmo tempo, era como se uma névoa de desconfiança pairasse sobre nós, como se o efêmero da relação virtual impedisse a criação de uma base sólida, um ponto de apoio. O tempo, essa força invisível, fazia e desfazia laços com uma naturalidade inquietante. E o que seria de nós, de nossa história, senão um emaranhado de certezas e incertezas? Ela me contava tudo, desde a infância até a vida adulta, como se estivesse entregando pedaços de sua alma em cada palavra. O peso de sua juventude, suas frustrações, seus anseios, suas vitórias e derrotas estavam em cada áudio, em cada linha digitada, como se eu fosse um confidente e, ao mesmo tempo, uma espécie de espelho para suas próprias angústias. A cada novo pedaço de sua história que me contava, o vínculo entre nós se tornava mais profundo, mas também mais difícil de compreender. Entre o conforto da amizade e a incerteza do que aquilo realmente representava, havia sempre uma tênue linha, uma sensação de que talvez estivéssemos presos a um momento, sem saber qual direção tomar. Afinal, como podemos confiar totalmente em alguém que, por mais que nos revele sua vida, permanece ainda uma figura distante, fragmentada pelas limitações do virtual? A calda incandescente passou e, com ela, um pedaço de mim também se foi, guardado nas memórias que, com o tempo, serão embaladas pela poeira do esquecimento. Mas, por ora, fico com a imagem dessa relação fugaz, da certeza de que, por um breve momento, duas vidas se cruzaram na imensidão da internet, marcando-se, por um instante, como estrelas que brilham e depois desaparecem, deixando apenas a lembrança de seu brilho no escuro da noite.
O fundo da vida.
O tédio, como um abismo silencioso, se instala no fundo da vida humana, muitas vezes sem aviso, e nos faz sentir a falta de algo que ainda não sabemos nomear. Não é a ausência de atividade que assusta, mas a falta de significado. Quando o ritmo frenético do mundo diminui, quando os barulhos e as distrações da vida se aquietam, o que resta é o eco do vazio. E nesse eco, sentimos que estamos no fundo. O fundo da vida. É curioso como, no fundo, a vida se revela para nós de maneira paradoxal: é no silêncio do tédio que as questões mais profundas surgem. A sensação de que estamos apenas passando pelo tempo, sem saber exatamente o que estamos fazendo, é uma das mais comuns e dolorosas. Talvez o tédio seja, na verdade, um reflexo de nossas próprias limitações diante de um mundo tão vasto e imprevisível. Ele nos força a encarar nossa própria finitude, nossa incapacidade de preencher o vazio com algo que realmente nos defina. A verdade é que todos, em algum momento, enfrentam esse fundo. Alguns buscam distrações, outros tentam preencher o vazio com novos projetos, relacionamentos ou bens materiais. Mas, no fim, o tédio retorna, e com ele, a velha pergunta: "O que estou realmente buscando?" O que falta para que a vida seja mais do que uma sucessão de momentos vazios, mais do que um simples passar do tempo? Talvez a busca pelo sentido da vida seja justamente a busca para sair desse fundo. Para encontrar algo que transcenda o tédio, que nos dê direção. Não é fácil, e talvez o tédio seja necessário para que possamos refletir sobre o que queremos, sobre o que realmente importa. Porque só no silêncio do vazio é que podemos ouvir a nós mesmos e tentar, mesmo que vagarosamente, nos erguer para algo mais significativo. O tédio, então, não é apenas um inimigo. Ele é, paradoxalmente, um aliado. Um espelho que reflete nossa humanidade, nossa fragilidade e nossa busca incessante por algo maior do que nós. E ao enfrentá-lo, podemos descobrir que a vida, mesmo no fundo, ainda tem algo a nos oferecer.
terça-feira, 16 de setembro de 2025
.oma a uE
Quando o amor vem de trás pra frente. Às vezes, as coisas mais belas da vida chegam de forma inesperada. Nem sempre o amor começa com declarações claras ou caminhos óbvios. Às vezes, ele vem ao contrário, como a frase acima citada. Lida de trás pra frente, revela sua alma: Eu a amo. Mas do jeito que está, é como se o sentimento estivesse escondido, tímido, camuflado nas entrelinhas do tempo e da linguagem é sobre aquele amor que não foi dito no momento certo, mas que vive ali, pulsando em silêncio. É sobre sentimentos que se embaralham antes de se revelarem. É o amor que não precisa gritar para existir.Talvez o coração fale mesmo ao contrário, tentando encontrar coragem para se fazer entender. E quando finalmente lemos com atenção, percebemos que a mensagem estava ali o tempo todo, esperando para ser decifrada. Porque no fim das contas, seja de frente ou ao contrário, o amor verdadeiro sempre encontra um jeito de ser lido.
domingo, 14 de setembro de 2025
O clamor do teu jardim.
Tu voltaste. E o jardim, esse que um dia te ofereceu flores sem pedir nada em troca te reconheceu. Mas já não era o mesmo. Nem ele nem tu. Vi teus passos pisarem a terra como quem pisa um sonho antigo. Vinham lentos, cansados, arrependidos. Como se o corpo soubesse o que a boca ainda hesitasse em dizer: tu amaste sim, mas calaste. E o amor, minha cara, não floresce na serenidade. Ajoelhaste-te diante de uma rosa caída, como se ela ainda pudesse te ouvir. Ao redor, pétalas murchas formavam um frágil coração desfeito como as promessas que não se cumpriram. Tocaste-as como se quisesses ressuscitar o que deixaste morrer por orgulho, por medo, por quietude. Mas o jardim que um dia vibrou sob tua presença, agora se curvava em silêncio contigo. As flores te escutaram. E morreram mais um pouco a cada tua palavra. "Eu amei mal… e tarde demais." disseste. E com essas palavras selaste teu destino. As rosas, outrora vermelhas de desejo e esperança, penderam suas cabeças como quem chora em segredo. O vento se fez lamento. O céu se vestiu de cinza. E até os pássaros, testemunhas do que já foi belo, silenciaram. Tu esperaste que ele compreendesse teus gestos contidos, esperaste que o amor sobrevivesse às tuas omissões. Mas o amor, mulher é flor que exige sol, palavra, toque, coragem. Ele te ofereceu primaveras e tu respondeste com invernos. Quiseste que ele lesse teus olhos quando teus olhos evitavam os dele, que ele sentisse tua falta enquanto tu fingias não sentir a dele. Quiseste que ele ficasse enquanto tu partias por dentro. Agora voltas ao jardim como quem volta a um passado que ainda arde. Mas as flores não te esperaram. Elas murcharam com tua ausência, secaram com tua demora e morreram com teu arrependimento. Tu queres refazer o desenho no chão, o coração de pétalas que o tempo desfez. Mas há coisas, minha querida, que não se refazem. O amor quando morre sem ter vivido por completo, não se planta duas vezes no mesmo solo. Porque certas flores só desabrocham uma vez como mandacarus. E as benditas flores não colhidas morrem acreditando que não eram belas o suficiente. Tu foste amada imensamente. Mas só percebeste isso quando já não havia mais perfume, nem cor, nem vida no jardim. Levas contigo o peso de uma história não vivida. E o jardim, esse que um dia foi teu, permanece ali como um espelho do que poderia ter sido. Que esta terra nunca mais te floresça, ou que floresça, enfim, onde tu aprendas a ficar, a dizer, a amar antes que seja tarde. As flores que morrem de sede não guardam rancor, mas esquecem do nome de quem não as regou.
terça-feira, 9 de setembro de 2025
O perigo do consenso absoluto.
Aparentemente, estar sempre de acordo com alguém pode parecer sinal de sintonia perfeita. Afinal, quem não deseja relações sem conflitos, discussões ou desentendimentos? No entanto, por trás de uma concordância constante pode estar escondido um fenômeno preocupante: a renúncia ao pensamento próprio. Quando duas pessoas jamais discordam, algo essencial está faltando a pluralidade de ideias. O pensamento humano é, por natureza, diverso, formado por vivências, valores, dúvidas e visões de mundo únicas. A discordância, nesse sentido, não é uma ameaça, mas um sinal de que há ali duas consciências ativas, autênticas, dialogando. O consenso absoluto, ao contrário, frequentemente revela um desequilíbrio: alguém pensa e o outro apenas consente. Seja por medo de desagradar, insegurança intelectual, ou hábito de submissão, essa harmonia artificial apaga a voz de um dos lados ou dos dois, se ambos estiverem apenas tentando manter a aparência de paz. É uma tranquilidade estéril, onde não há crescimento, questionamento ou transformação. Na história, nos relacionamentos e até nas organizações, o pensamento crítico nasce do atrito saudável entre ideias diferentes. O debate construtivo é o que impulsiona decisões mais justas, relações mais maduras e sociedades mais conscientes. Já o silêncio disfarçado de concordância pode ser conveniente, mas empobrece o diálogo e enfraquece a liberdade. Portanto, é preciso desconfiar da unanimidade fácil. Pensar diferente não é romper, é enriquecer. A verdadeira harmonia não está na ausência de discordância, mas na capacidade de ouvir, refletir e, quando necessário, discordar com respeito. Porque só assim garantimos que todos realmente pensam e não que apenas repetem o pensamento de outro.
domingo, 7 de setembro de 2025
O despertar na calmaria da vingança.
Eu não era assim. Havia em mim um ser doce, um coração sem armaduras, um desejo atroz por você, como se o mundo coubesse inteiro em um único nome: o seu. Eu te amei como quem crê no milagre do inesperado, no perfume do intocável. Amor para mim era um templo, e você era o altar onde eu rezava minha fé cega. Mas o tempo, ah, o tempo, esse escultor de verdades que os olhos não veem, começou a bater à porta do meu peito, trazendo respostas que eu jamais pedi. E fui vendo aos poucos o quanto eu era cego dentro do brilho falso do seu olhar. Na retina um véu. No seu toque um ensaio. No seu carinho o ensaio de um abandono silencioso. Você sorria e eu retribuía também. Mas era um teatro. Você ensaiava a despedida, eu sem saber a permanência. Seus enganos se enraizaram como erva daninha nos campos onde plantei confiança. E quando tudo floresceu, as flores tinham espinhos que eu não via. E eu sangrei. Sangrei em silêncio, como quem ainda crê que vale a pena. Mas o hoje não resta em mim o mesmo homem. Há em mim uma vingança calma, não de faca nem de grito, mas de ausência. A vingança de quem foi e não volta. De quem amou e agora se basta. O coração que antes pulsava seu nome agora palpita liberdade. A alma que te esperava nas madrugadas agora dança com o vento sem rumo, sem amarras, livre. E se há ainda algo de você em mim, é só a lembrança do que não quero mais ser. A memória de um amor que me traiu com o silêncio, com a negligência, com o desprezo embalado em gentileza. Você enxovalhou meu coração com uma harmonia falsa, com promessas costuradas em mentiras. E agora eu reescrevo meus dias com mãos firmes e olhos abertos. Não te odeio. De modo algum te amo. Em nenhum momento te quero. O que mora em mim agora é o eco da dor que me despertou, é a vingança mansa de quem sobreviveu. De quem amou e aprendeu a amar a si mesmo mais.
Nas masmorras do amor.
Nas masmorras do amor, sem correntes nem grades, mas com o peso do mundo em cada lembrança habito os corredores escuros da saudade, como quem cumpre pena por crer na esperança. Fui réu confesso dos sonhos que tivemos julgado pelo tempo e condenado à solidão. As promessas que fizemos já nem sei se as dissemos ecoam vazias no cárcere do coração. A vida, essa juíza impiedosa, revisitou o que o desejo ocultou. Em teus olhos vi a alvorada mais formosa, mas era ilusão: a noite nunca passou. Lembro-me de ti em cada esquina do dia, em cada sombra que o sol projeta no chão, em cada rosto, em cada melodia, tua ausência ressoa como um trovão. E então te vejo entre mil rostos perdidos, como se o destino zombasse de mim. Caminhas tranquila, passos bem definidos e eu prisioneiro, sem começo, meio ou fim. Tu cruzas a rua, tua silhueta, poesia viva, o vento brinca com teus cabelos como antes. Meu peito se agita, a lembrança é nociva como vinhos antigos, amargos e cortantes. Finges desejo com um olhar que me atravessa. Ofereces-te os lábios veneno em tentação. Mas é teatro teu gesto logo se dispersa, e cruzas para o outro lado sem dar explicação. Finges não me ver. És atriz da indiferença. E eu, coadjuvante do amor que não venceu, sinto a dor calada da tua presença e a ausência gritante do que nunca foi meu. Oh, doce engano moldado em teu sorriso! Quantas noites eu vaguei buscando abrigo, pensando no toque, no beijo, no aviso de que talvez nunca estiveres comigo. A vida segue cruel, sem rima nem razão, mas sigo também, mesmo sem direção. Pois quem ama demais, não perde a paixão, apenas aprende a conviver com a prisão. E nos calabouços do amor sigo a viver com a chave da liberdade no passado. Teu nome tatuado em meu próprio sofrer, teu rosto nos muros do sonho trancado. Mas que seja assim, se assim tiver de ser, pois mesmo na dor teu rastro é calor. E mesmo fingindo não mais me ver, ainda te amo com todo rancor e amor.
sexta-feira, 5 de setembro de 2025
Quando a saudade chegou sem avisar.
Não mais que de repente ela foi embora. Estaqueou meu coração sem aviso, sem alarde, sem tempo para entender o que estava por vir. Apenas virou as costas e levou com ela tudo que fazia sentido: a rotina, a calma, o calor da presença. Deixou o silêncio. Um mistério que grita que pesa que machuca. Naquele instante meu coração parou. Desalinhou-se como quem leva um golpe e não entende de onde veio. E junto com ele caiu meu orgulho, esse muro tolo que construí para esconder o que sentia. Foi só quando ela se foi que eu vi com clareza: eu não era nada sem ela. Nada além de um corpo vagando por aí, tentando fingir força onde só existia vazio. A saudade não pediu licença. Entrou feito vento forte, bagunçando tudo por dentro. Tomou conta dos lugares mais íntimos, do travesseiro ao pensamento. Ela está na caneca de café que uso na minha predileta música que ela cantava baixinho na porta que não se fecha mais com o mesmo som. É nessas pequenas coisas que a ausência se faz presente. É ali que dói mais. E eu, que acreditava ser inteiro, descobri que era ela quem me completava. Era a voz dela que acalmava minha pressa, o olhar dela que me trazia de volta quando eu me perdia de mim mesmo. Era a presença dela que dava sentido aos meus dias comuns. Agora tudo é pausa. Tudo é espera. Tudo é lembrança. Dizem por aí que o tempo cura tudo. Mas ninguém fala do que ele não leva embora. O tempo passa, sim, mas a saudade fica. Fica como marca, como sombra, como eco. E mesmo que a dor um dia diminua, ela nunca desaparece completamente. Porque o que é verdadeiro não se apaga: transforma-se em memória. E é assim que sigo: lembrando: sentindo sobrevivendo à sua fragmentada ausência, um dia de cada vez.
Talvez eu não aprenda a viver sem ela, uma luz no meu caminho.
Mas, habitualmente e hoje, como sempre eu só aprendi a sentir a falta.
E lembrar-me dela exaustivamente, mesmo que me doa ainda é a forma mais bonita
que encontrei de não deixá-la partir por completo.
Nada além de poeira
Lá, deitado na maca, com os olhos presos no teto sem cor, compreendi o que tantos já disseram, mas poucos de fato sentem: somos poeira. Pequenos demais para tanta arrogância. Insignificantes demais para tanto orgulho. Em menos de três minutos, a anestesia me levou. Um apagão suave, inevitável. Mas antes disso, ainda lúcido, senti um silêncio que não vinha de fora, mas de dentro. Um silêncio que desmonta e revela. Ali, naquele instante em que a consciência se esvai, tudo o que construímos para parecer fortes se dissolve. O autoritarismo se cala. A soberba perde o fôlego. Os títulos, as certezas, as máscaras, todos ficam do lado de fora da sala. Dentro só resta o frágil ser humano, entregue e vulnerável. Não somos nada. E, paradoxalmente, talvez seja exatamente aí que mora alguma verdade. Não no poder, mas na entrega. Não na força, mas na aceitação da nossa finitude. É estranho pensar que, para muitos, essa percepção só vem quando estamos deitados, imobilizados, prestes a adormecer diante de mãos desconhecidas. Mas talvez seja assim mesmo. Só nos damos conta da nossa pequenez quando não temos mais como fingir que somos grandes. No fim, somos poeira. Mas também somos consciência. E às vezes perceber isso já basta.
Intuição, Inocência e Fé.
Não abandone suas três grandes e inabaláveis amigas: a Intuição, a Inocência e a Fé. Ao longo da vida, somos ensinados a acumular conhecimento, desenvolver habilidades, cultivar experiências e buscar certezas. Mas, curiosamente, quanto mais crescemos, mais nos afastamos de três presenças silenciosas e poderosas que estiveram conosco desde o início: a Intuição, a Inocência e a Fé. Essas três amigas não gritam, não disputam espaço, não exigem explicações. Elas apenas esperam com paciência que voltemos para casa para dentro de nós mesmos. A Intuição: a sabedoria que não precisa de palavras À Intuição é aquela voz que sussurra antes que a mente formule argumentos. Ela é o pressentimento, o arrepio, o caminho que parece certo mesmo sem lógica aparente. Não é superstição, tampouco impulso vazio. É sabedoria antiga que se manifesta sem pedir licença. Num mundo onde tudo precisa ser provado, medido, calculado, a intuição é muitas vezes desacreditada. No entanto, quantas vezes já nos arrependemos por não tê-la escutado? Ela percebe o que os olhos não veem, sente o que as palavras não dizem. Ignorá-la é como tapar os ouvidos para um conselho vindo do nosso eu mais profundo. Manter a amizade com a intuição é manter o canal aberto com o invisível, com o que está além da razão e muitas vezes é lá que mora a verdade. A Inocência: a pureza que enxerga com o coração A inocência não é tolice, não é ignorância. É a capacidade de ver o mundo com olhos limpos, sem cinismo, sem o peso das decepções. É a criança que ainda vive em nós, acreditando no bem, na beleza, no recomeço. Na pressa de crescer, trocamos a inocência pela desconfiança, como se fosse sinal de maturidade suspeitar de tudo e de todos. Mas o cético excessivo raramente encontra paz. Já o inocente, aquele que ainda consegue se maravilhar com a vida, experimenta um tipo de alegria que não se compra nem se ensina: apenas se sente. Conservar a inocência é manter viva a sensibilidade, a empatia, a esperança. Ela nos protege do endurecimento da alma, do olhar amargo. É ela que nos permite amar de novo, confiar de novo, começar de novo. A Fé: o sustento invisível nos dias escuros À fé é a chama que não se apaga mesmo quando tudo ao redor escurece. Não importa em que ou em quem você acredita o essencial é que você acredite. Ter fé é seguir andando mesmo sem saber o que vem depois da curva. É confiar que há sentido mesmo quando tudo parece sem modo algum. A fé não precisa de prova, ela é a prova. Em tempos de dúvida, crise, perda ou solidão, é ela que nos mantém de pé. Enquanto o medo paralisa, a fé impulsiona. Enquanto a razão limita, a fé expande. Fé é resistência. É ponte entre o finito e o eterno. É a certeza de que, mesmo no caos, existe uma ordem maior agindo em silêncio. Não as abandone. Nunca. A intuição, a inocência e a fé não são luxos espirituais são ferramentas de sobrevivência da alma. São raízes que nos mantêm conectados ao essencial quando tudo o mais nos afasta de nós mesmos. Quando o mundo te fizer duvidar de tudo, que você ainda se lembre de ouvir a intuição, de preservar a inocência e de cultivar a fé. Elas caminham com você desde o berço. E, se você se permitir elas as acompanharão até o fim como grandes e resolutas amigas.