Não fui militar, eu era um simples funcionário público, como
muitos outros, mas não sei por que terminei na Capitão.
Machado era o nome dela, mesmo assim, o meu santo não ia com o
dela, enfim eu não gostava dela. Tudo que sei, é que nunca ostentei títulos da
realeza e nem tampouco militares, mas eles me perseguiram até o momento do
desfecho, mas de alguns eu até gostei. Menezes era bom. Foi onde iniciei a
minha trajetória, conquistando juntamente com a minha família, a independência
tão sonhada, pois, após o casamento eu morei com a minha mãe Lucia, e deu para
guardar um pouco de dinheiro, para comprar um modesto terreninho nas imediações
da Praça Barão da Taquara. Comprei com um parceiro com o nome de “Job”, ele era
esperto, mas creio que não era chegado ao trabalho. Por isso deram-lhe esse
nome. Lá, no 139, na Doutor Carlos Gross, foi o meu pé de coelho. Com a
ajuda de meus amigos, em especial a de “Zezé molequinho”, ergui a minha casa
para a acomodação da minha numerosa família, eu era feliz e não sabia. Geralmente,
eu sentava no meu cantinho predileto da varanda e passava várias horas, absorto
e pensando nos meus desejos realizados e sempre sonhando em conseguir melhorias
para todos, entre uma tragada e outra, acompanhando os caminhos da fumaça em
busca de novos horizontes. Lembro-me de que nos fins de semana eu era brindado
com a visita do meu irmão Haroldo, para almoçarmos aquela deliciosa galinha
assada, preparada por Moema. Muito antes disso, perdi uma das vistas num
acidente doméstico. Lutei bravamente e mesmo assim não esmoreci e consegui
criar meus nove filhos, sempre acompanhado da minha incansável esposa, Moema,
na base de “melhores dias virão”. Um acontecimento me marcou, quando fui ao
necrotério entregar mais uma vítima da morte, na função que era delegada a mim.
O cidadão estava na maca inerte e movimentava o dedão do pé. Agora não me lembro
de se foi o direito ou esquerdo. Corri apavorado e perguntei ao médico se
haveria a possibilidade dele estar vivo. O guardião da vida informou-me que ele
de fato estava morto, usando termos técnicos para aquela situação. Aí, sim,
tive medo da figura que assusta principalmente as crianças com a foice na mão. E
essa visão me acompanhou por muitos anos, sendo comentada em toda a minha
existência aos parentes mais próximos. Os meus jalecos, bem passados e na cor
alva, deixavam os pacientes intrigados. Ora me chamavam de doutor, ora de
senhor, mas no fundo eu era administrador. Embora esse assunto seja
“dispensário”, o meu grande companheiro Conceição, com seu modesto caminhão.
Ele me quebrava alguns galhos e às vezes, me transportava de jipe do hospital
Dispensário Carmela Dutra, uma prerrogativa da minha função, às vezes do
trabalho para casa ou de casa para o trabalho. Na Candido Benício, minha estada
foi obrigatória, tanto que estive lá, por duas vezes. Na Bernardino, eu era
“doutor”, e minha especialidade “guloseimas”. Com o passar dos tempos, e sempre
buscando uma melhor tranquilidade para a minha família, mudei de ares. Estive
na Dona Clara e Travessa Carlos Xavier, onde adquiri outro imóvel, mas por
adversidades que a vida nos impõe, tive que vender. Enfim, Madureira não me
trouxera boas recordações. Com barões me empolguei e lembrei-me dos meus tempos
de menino. Na Rua Bom Retiro, eu vivi algumas apreensões, mas eu não achava
nada mal morar lá. Estive também na Nelson Cardoso, Godofredo Viana, Coronel
Tendim e consequentemente onde foi o meu fim. O tempo passou num passe de
mágica, meus filhos cresceram quase todos se casaram me deram netos e estes,
bisnetos. E só um filho permaneceu com o que restou. Com muitas ferramentas que
usei, lembro-me de duas que não trabalhei, porque eu não gostava. E tudo aquilo
que construí, se tornou um paradigma. No entanto, a minha vida ceifou. A foice
e o machado, definitivamente tudo acabou. E nos corações, a saudade de quem
ficou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário