terça-feira, 28 de outubro de 2025

A flor da esperança.

Pode sorrir à vontade. O seu sorriso já não me desarma como antes, mas ainda ilumina o canto mais secreto das minhas lembranças. Há algo em ti que o tempo não conseguiu levar: a essência que um dia me fez acreditar que o amor podia ser abrigo e tempestade ao mesmo tempo. No entanto, hoje, aprendi a olhar para esse sorriso sem me perder, porque no meu jardim viceja forte, teimosa, bela, a flor do desejo. Essa flor nasceu das ruínas. Brotou entre as pedras do meu ego silencioso, entre as ausências que gritavam quando seu nome já não se ouvia. Eu cuidei dela com as mãos feridas e reguei-a com lágrimas escondidas que já não eram de dor, mas de renascimento. E foi assim que compreendi: o amor, quando amadurece, não implora permanência ele floresce, mesmo quando outra parceria se desfaz. Tu e eu formamos um lindo par, e disso não me envergonho. Houve em nós um fogo que iluminou noites e cegou dias. Fomos intensidade, verdade e entrega. Mas a beleza de um jardim não está em prender o vento, mas em deixá-lo soprar e ver o que resiste depois da ventania. E o que resistiu, dentro de mim, foi essa força mansa que aprendi a chamar de esperança. A sua fascinação ainda persiste no meu coração, é verdade. Ela mora nas entrelinhas do que fui às lembranças que às vezes me visitam quando a noite é longa. Mas já não me fere; hoje, é lembrança doce, não ferida aberta. Porque o coração que um dia te ofertou paz e segurança agora oferece isso a si mesmo. Descobri que a paz não está em quem fica nem em quem vai. Está em quem aprende a florir, mesmo só. A segurança não vem do abraço alheio, mas da certeza de que posso caminhar com os meus próprios passos, sem deixar de acreditar no amor. O meu jardim segue vivo. Nele, cada pétala guarda um pedaço da nossa história, mas também o perfume de tudo o que ainda está por vir. São essências de sentimentos e apegos. A flor da inspiração fascina e cresce firme, entre memórias e recomeços, porque ela aprendeu como eu, que o amor verdadeiro nunca morre. Ele se transforma. E se um dia passares por esse jardim novamente, talvez sintas o mesmo perfume de antes. Mas não te enganes, não é saudade que paira no ar. É força. É vida. É a prova de que, mesmo depois do adeus, a confiança continua a vicejar, altiva, no meu peito.

 

domingo, 26 de outubro de 2025

O relógio que o tempo não consome.

Encontrei lá no fundo do roupeiro, perdido entre quinquilharias esquecidas, o meu antigo relógio analógico da marca Mido. Foi como reencontrar um velho amigo que o tempo afastou, mas nunca apagou da lembrança. O metal já sem o mesmo brilho, a pulseira ligeiramente marcada pelos anos que, no entanto, bastou tocá-lo para que algo dentro de mim voltasse a pulsar. Esse relógio sempre foi mais do que um simples medidor de horas. Era uma espécie de companheiro silencioso, testemunha dos meus dias, dos atrasos e das pressas que me acompanhavam. Havia nele uma mania ou talvez uma teimosia que eu mesmo inventei: todos os dias, quase por instinto, atrasava os ponteiros alguns minutos. Não sei se era medo de chegar cedo demais às coisas ou vontade de enganar o tempo. Talvez fosse só uma forma de dizer que ele não mandava em mim. Lembro-me bem da transição que os anos trouxeram. Na década de setenta, o Brasil começou a ser invadido pelos relógios digitais, símbolo de uma modernidade que se anunciava com números brilhantes e sons metálicos. As vitrines pareciam prometer um futuro mais preciso e mais veloz, e também mais eficiente. Aos poucos, o velho Mido foi sendo deixado de lado. Primeiramente passou a dormir na cabeceira da cama, depois a repousar em alguma gaveta. O mundo girava mais rápido, e eu, sem perceber, fui deixando que o tempo me ultrapassasse. Hoje, ao encontrá-lo, percebo que o relógio ainda carrega os segundos com a mesma dignidade de antes. Não importa se parou se já não funciona como antes. Ele continua sendo o símbolo de uma época em que o tempo parecia mais humano, mais elástico, mais nosso. Há uma ternura em seu silêncio, uma fidelidade que as máquinas modernas jamais conhecerão. E talvez por isso eu tenha feito um pedido: que, quando chegar minha hora, apesar de meu ceticismo, que coloquem o Mido junto a mim, dentro do esquife. Não por vaidade, nem por apego material, mas por reconhecimento. Porque ele foi, durante tantos anos, o companheiro que marcou meus dias, o cúmplice das minhas pequenas rebeldias contra o relógio da vida. Sei que o meu corpo, como tudo o que é vivo, será um dia devorado pela terra. Mas o meu relógio? Ah, esse jamais será “coMIDO”. Ele continuará de algum modo, resistindo. Porque há objetos que não morrem. Guardam em si a alma de quem os usou, o rastro das horas que viveram juntos. No fim, compreendo que o tempo não é inimigo, mas espelho. Ele apenas reflete o que fomos capazes de viver nem mais, nem menos. Os ponteiros do Mido talvez tenham parado, mas dentro de mim ainda giram, lembrando que cada segundo teve um propósito, cada atraso uma história, cada batida uma presença. E talvez seja isso a eternidade: não o tempo que continua, mas o instante que permanece em gravações de lembranças.

 

sexta-feira, 24 de outubro de 2025

Marcas no horizonte.

Fitando o horizonte as marcas do teu passo. Não é miragem, não são as impressões descalças na areia. Essas se perdem nas pequenas ondas do mar. Esse sentimento de perda em te ires para sempre deixou meu coração desalinhado como figura geométrica em alto relevo fora de foco. Mas ainda assim caminho, mesmo que em desordem, tropeçando nas lembranças que o vento e o mar insistem em devolver à minha paz. Há algo de permanente no efêmero. Uma cicatriz suave no tempo, onde o toque da tua ausência repousa. Tento redesenhar o contorno do teu rastro no ar, como quem desenha o invisível com os dedos, procurando no vazio o eco de um sorriso antigo. As horas passam lentas, como se o relógio também lamentasse. O horizonte, antes promessa, agora é linha de despedida. E eu, aprendiz de solidão, aprendo a seguir sem apagar o que ficou. Porque há passos que, mesmo quando o mar apaga, permanecem. Não na areia, mas na memória do coração que, aos poucos, tenta se realinhar novamente, ainda que torto, ainda que teu. Recolho as lembranças com o cuidado de quem recolhe conchas na beira do mar. E uma delas guarda um som, um instante, uma forma de existir que o vento não levou por completo. Aprendo, aos poucos, que há perdas que não se superam: apenas se transformam em silêncio, em calma, em gesto de seguir adiante e sem despedidas.

terça-feira, 21 de outubro de 2025

A rosa e a minha dor.

 A rosa é um símbolo da beleza que transcende a dor. Ela cresce delicada e intensa, mesmo no terreno mais árido, refletindo a capacidade de florescer apesar dos desafios da vida. Cada pétala parece carregar consigo a suavidade da esperança, enquanto seus espinhos, embora pungentes, são um lembrete de que a dor e a beleza coexistem. Ela não é apenas uma flor, é um reflexo do nosso ser das nossas cicatrizes, das nossas fragilidades e das nossas forças, inclusive as emocionais. E é nesse campo fértil, onde a dor tenta se enraizar, que a rosa se ergue, trazendo consigo uma promessa. No canto qualquer do meu coração, onde a saudade se esconde, o amor deve chegar como diz a letra de uma linda canção. Não como uma luz ofuscante, mas como um perfume suave que preenche os espaços vazios, aquecendo a alma, dissolvendo as sombras. O amor, embora tímido e distante, sempre encontra um caminho para chegar, ainda que seja necessário atravessar as tempestades. Quando olho para a minha flor, percebo que, às vezes, a dor que sinto não é a única verdade em minha vida. Há algo mais, algo que brilha, ainda que as sombras me envolvam. A rosa é como um sinal de que, por mais difícil que seja sempre há algo precioso a ser encontrado, uma beleza que vale mais que qualquer sofrimento, uma razão para seguir adiante. Ela é a representação da resiliência, do amor que floresce até nas condições mais desafiadoras, e, acima de tudo, é a promessa de que, por mais forte que seja a dor, sempre há algo em nossa jornada que vale a pena. E, talvez, isso seja o que nos mantém vivos e buscando, em meio ao caos, um motivo para continuar um amor que, no fim, sempre encontra seu lugar, mesmo que escondido num canto qualquer do coração.

 

domingo, 19 de outubro de 2025

Liberdade! Uma palavra inegociável.

Ser livre é mais do que caminhar sem correntes. É respirar o próprio destino,é abrir as asas do espírito e permitir-se ser. Liberdade é sentir o mundo dentro de si, é ouvir o chamado da alma e seguir, mesmo que o caminho seja incerto. Ela nasce do encontro com a verdade, do gesto digno do coração que não se curva diante da injustiça ou do medo. É o grito silencioso de quem ousa sonhar, de quem acredita que o bem pode florescermesmo no solo árido da dor. Há aqueles que fazem da vida um ato de resistência, que transformam o amor em força, e a compaixão em revolução. São almas luminosas que lutam por um mundo melhor, onde o respeito e a dignidade sejam a regra, e não a exceção. São os construtores de um futuro mais humano, aqueles que compreendem que ser livre é também desejar a liberdade de todos. Mas a liberdade vai além do sentimento humano ela pulsa em toda forma de vida. Há quem, com boas intenções, aprisione seus animais, achando proteger, quando na verdade os limita. Cães e gatos que olham o céu pelas frestas, aves que nunca sentiram o vento de verdade, vidas contidas em espaços pequenos, sem contato com outros animais,  para explorarem e sentirem o mundo. Liberdade não é luxo é necessidade vital, de homens, de bichos, de tudo o que respira e sente. A verdadeira liberdade é generosa: não se contenta em ser apenas individual. Ela se multiplica no olhar, no gesto, no amor compartilhado. Nasce então a gratidão por estar vivo, por poder escolher, por aprender com cada ser que divide o caminho. Ser livre é reconhecer o milagre de existir. É erguer-se diante das quedas e agradecer, mesmo em meio ao caos, pela chance de recomeçar. A liberdade é o sopro da vida. A gratidão, o perfume que ela deixa ao passar em nossas vivências. Eu vejo isso de perto quando abro a porta de entrada da minha casa em Praia Seca RJ, os canários da terra em cantos que em revoada amarelas dispersam-se em lindos sons de canto. Nada melhor do que a liberdade!

 

quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Beijo que desata silêncios.

Na curva do lábio onde o silêncio adormece, há noites inteiras que pedem calor. Palavras trêmulas, nunca ditas, desejos guardados no sabor do pudor. A boca dela — pétala e segredo - grita em silêncio, geme em sonho. Carrega o peso de vontades contidas, e a sede antiga de um toque risonho. Sufocar essa solidão, não com pressa, nem com posse, mas com um beijo que saiba escutar, com mãos que leiam sua pele, com olhos que saibam ficar. É chegar sem romper, desatar os nós com carinho, respeitar o tempo do corpo e incendiar o caminho. Porque nem todo toque é encontro, mas há beijos que acendem o que antes dormia e devolvem à boca a alegria. Beijo que desata silêncios não é urgência é presença. É arte de amar com paciência.

quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Entre certezas e incertezas

Não sei de onde ela veio, nem para onde vai. Sua presença foi como a de um cometa que, de repente, cruzou o céu da minha vida, iluminando-a com sua intensidade, para logo em seguida desaparecer na vastidão do desconhecido. Nos envolvemos virtualmente, uma conexão que se teceu através das palavras digitadas, os sons das mensagens de áudio e, esporadicamente, a voz através da linha telefônica. Uma relação marcada pela efemeridade, como tudo que se constrói nas redes invisíveis do mundo digital. A cada conversa, ela se abria mais, e eu, de alguma forma, sabia escutar. Ela dizia que minha voz acalmava seu coração, e de certo modo, eu acreditava que sua confiança em mim era algo raro e precioso. Mas, ao mesmo tempo, era como se uma névoa de desconfiança pairasse sobre nós, como se o efêmero da relação virtual impedisse a criação de uma base sólida, um ponto de apoio. O tempo, essa força invisível, fazia e desfazia laços com uma naturalidade inquietante. E o que seria de nós, de nossa história, senão um emaranhado de certezas e incertezas? Ela me contava tudo, desde a infância até a vida adulta, como se estivesse entregando pedaços de sua alma em cada palavra. O peso de sua juventude, suas frustrações, seus anseios, suas vitórias e derrotas estavam em cada áudio, em cada linha digitada, como se eu fosse um confidente e, ao mesmo tempo, uma espécie de espelho para suas próprias angústias. A cada novo pedaço de sua história que me contava, o vínculo entre nós se tornava mais profundo, mas também mais difícil de compreender. Entre o conforto da amizade e a incerteza do que aquilo realmente representava, havia sempre uma tênue linha, uma sensação de que talvez estivéssemos presos a um momento, sem saber qual direção tomar. Afinal, como podemos confiar totalmente em alguém que, por mais que nos revele sua vida, permanece ainda uma figura distante, fragmentada pelas limitações do virtual? A calda incandescente passou e, com ela, um pedaço de mim também se foi, guardado nas memórias que, com o tempo, serão embaladas pela poeira do esquecimento. Mas, por ora, fico com a imagem dessa relação fugaz, da certeza de que, por um breve momento, duas vidas se cruzaram na imensidão da internet, marcando-se, por um instante, como estrelas que brilham e depois desaparecem, deixando apenas a lembrança de seu brilho no escuro da noite.

O fundo da vida.

O tédio, como um abismo silencioso, se instala no fundo da vida humana, muitas vezes sem aviso, e nos faz sentir a falta de algo que ainda não sabemos nomear. Não é a ausência de atividade que assusta, mas a falta de significado. Quando o ritmo frenético do mundo diminui, quando os barulhos e as distrações da vida se aquietam, o que resta é o eco do vazio. E nesse eco, sentimos que estamos no fundo. O fundo da vida. É curioso como, no fundo, a vida se revela para nós de maneira paradoxal: é no silêncio do tédio que as questões mais profundas surgem. A sensação de que estamos apenas passando pelo tempo, sem saber exatamente o que estamos fazendo, é uma das mais comuns e dolorosas. Talvez o tédio seja, na verdade, um reflexo de nossas próprias limitações diante de um mundo tão vasto e imprevisível. Ele nos força a encarar nossa própria finitude, nossa incapacidade de preencher o vazio com algo que realmente nos defina. A verdade é que todos, em algum momento, enfrentam esse fundo. Alguns buscam distrações, outros tentam preencher o vazio com novos projetos, relacionamentos ou bens materiais. Mas, no fim, o tédio retorna, e com ele, a velha pergunta: "O que estou realmente buscando?" O que falta para que a vida seja mais do que uma sucessão de momentos vazios, mais do que um simples passar do tempo? Talvez a busca pelo sentido da vida seja justamente a busca para sair desse fundo. Para encontrar algo que transcenda o tédio, que nos dê direção. Não é fácil, e talvez o tédio seja necessário para que possamos refletir sobre o que queremos, sobre o que realmente importa. Porque só no silêncio do vazio é que podemos ouvir a nós mesmos e tentar, mesmo que vagarosamente, nos erguer para algo mais significativo. O tédio, então, não é apenas um inimigo. Ele é, paradoxalmente, um aliado. Um espelho que reflete nossa humanidade, nossa fragilidade e nossa busca incessante por algo maior do que nós. E ao enfrentá-lo, podemos descobrir que a vida, mesmo no fundo, ainda tem algo a nos oferecer.

terça-feira, 16 de setembro de 2025

.oma a uE

Quando o amor vem de trás pra frente. Às vezes, as coisas mais belas da vida chegam de forma inesperada. Nem sempre o amor começa com declarações claras ou caminhos óbvios. Às vezes, ele vem ao contrário, como a frase acima citada. Lida de trás pra frente, revela sua alma: Eu a amo. Mas do jeito que está, é como se o sentimento estivesse escondido, tímido, camuflado nas entrelinhas do tempo e da linguagem é sobre aquele amor que não foi dito no momento certo, mas que vive ali, pulsando em silêncio. É sobre sentimentos que se embaralham antes de se revelarem. É o amor que não precisa gritar para existir.Talvez o coração fale mesmo ao contrário, tentando encontrar coragem para se fazer entender. E quando finalmente lemos com atenção, percebemos que a mensagem estava ali o tempo todo, esperando para ser decifrada. Porque no fim das contas, seja de frente ou ao contrário, o amor verdadeiro sempre encontra um jeito de ser lido.

domingo, 14 de setembro de 2025

O clamor do teu jardim.

Tu voltaste. E o jardim, esse que um dia te ofereceu flores sem pedir nada em troca te reconheceu. Mas já não era o mesmo. Nem ele nem tu. Vi teus passos pisarem a terra como quem pisa um sonho antigo. Vinham lentos, cansados, arrependidos. Como se o corpo soubesse o que a boca ainda hesitasse em dizer: tu amaste sim, mas calaste. E o amor, minha cara, não floresce na serenidade. Ajoelhaste-te diante de uma rosa caída, como se ela ainda pudesse te ouvir. Ao redor, pétalas murchas formavam um frágil coração desfeito como as promessas que não se cumpriram. Tocaste-as como se quisesses ressuscitar o que deixaste morrer por orgulho, por medo, por quietude. Mas o jardim que um dia vibrou sob tua presença, agora se curvava em silêncio contigo. As flores te escutaram. E morreram mais um pouco a cada tua palavra. "Eu amei mal… e tarde demais." disseste. E com essas palavras selaste teu destino. As rosas, outrora vermelhas de desejo e esperança, penderam suas cabeças como quem chora em segredo. O vento se fez lamento. O céu se vestiu de cinza. E até os pássaros, testemunhas do que já foi belo, silenciaram. Tu esperaste que ele compreendesse teus gestos contidos, esperaste que o amor sobrevivesse às tuas omissões. Mas o amor, mulher é flor que exige sol, palavra, toque, coragem. Ele te ofereceu primaveras e tu respondeste com invernos. Quiseste que ele lesse teus olhos quando teus olhos evitavam os dele, que ele sentisse tua falta enquanto tu fingias não sentir a dele. Quiseste que ele ficasse enquanto tu partias por dentro. Agora voltas ao jardim como quem volta a um passado que ainda arde. Mas as flores não te esperaram. Elas murcharam com tua ausência, secaram com tua demora e morreram com teu arrependimento. Tu queres refazer o desenho no chão, o coração de pétalas que o tempo desfez. Mas há coisas, minha querida, que não se refazem. O amor quando morre sem ter vivido por completo, não se planta duas vezes no mesmo solo. Porque certas flores só desabrocham uma vez como mandacarus. E as benditas flores não colhidas morrem acreditando que não eram belas o suficiente. Tu foste amada imensamente. Mas só percebeste isso quando já não havia mais perfume, nem cor, nem vida no jardim. Levas contigo o peso de uma história não vivida. E o jardim, esse que um dia foi teu, permanece ali como um espelho do que poderia ter sido. Que esta terra nunca mais te floresça, ou que floresça, enfim, onde tu aprendas a ficar, a dizer, a amar antes que seja tarde. As flores que morrem de sede não guardam rancor, mas esquecem do nome de quem não as regou.

 

terça-feira, 9 de setembro de 2025

O perigo do consenso absoluto.

Aparentemente, estar sempre de acordo com alguém pode parecer sinal de sintonia perfeita. Afinal, quem não deseja relações sem conflitos, discussões ou desentendimentos? No entanto, por trás de uma concordância constante pode estar escondido um fenômeno preocupante: a renúncia ao pensamento próprio. Quando duas pessoas jamais discordam, algo essencial está faltando a pluralidade de ideias. O pensamento humano é, por natureza, diverso, formado por vivências, valores, dúvidas e visões de mundo únicas. A discordância, nesse sentido, não é uma ameaça, mas um sinal de que há ali duas consciências ativas, autênticas, dialogando. O consenso absoluto, ao contrário, frequentemente revela um desequilíbrio: alguém pensa e o outro apenas consente. Seja por medo de desagradar, insegurança intelectual, ou hábito de submissão, essa harmonia artificial apaga a voz de um dos lados ou dos dois, se ambos estiverem apenas tentando manter a aparência de paz. É uma tranquilidade estéril, onde não há crescimento, questionamento ou transformação. Na história, nos relacionamentos e até nas organizações, o pensamento crítico nasce do atrito saudável entre ideias diferentes. O debate construtivo é o que impulsiona decisões mais justas, relações mais maduras e sociedades mais conscientes. Já o silêncio disfarçado de concordância pode ser conveniente, mas empobrece o diálogo e enfraquece a liberdade. Portanto, é preciso desconfiar da unanimidade fácil. Pensar diferente não é romper, é enriquecer. A verdadeira harmonia não está na ausência de discordância, mas na capacidade de ouvir, refletir e, quando necessário, discordar com respeito. Porque só assim garantimos que todos realmente pensam e não que apenas repetem o pensamento de outro.

domingo, 7 de setembro de 2025

O despertar na calmaria da vingança.

Eu não era assim. Havia em mim um ser doce, um coração sem armaduras, um desejo atroz por você, como se o mundo coubesse inteiro em  um único nome: o seu. Eu te amei como quem crê no milagre do inesperado, no perfume do intocável. Amor para mim era um templo, e você era o altar onde eu rezava minha fé cega. Mas o tempo, ah, o tempo, esse escultor de verdades que os olhos não veem, começou a bater à porta do meu peito, trazendo respostas que eu jamais pedi. E fui vendo aos poucos o quanto eu era cego dentro do brilho falso do seu olhar. Na retina um véu. No seu toque um ensaio. No seu carinho o ensaio de um abandono silencioso. Você sorria e eu retribuía também. Mas era um teatro. Você ensaiava a despedida, eu sem saber a permanência. Seus enganos se enraizaram como erva daninha nos campos onde plantei confiança. E quando tudo floresceu, as flores tinham espinhos que eu não via. E eu sangrei. Sangrei em silêncio, como quem ainda crê que vale a pena. Mas o hoje não resta em mim o mesmo homem. Há em mim uma vingança calma, não de faca nem de grito, mas de ausência. A vingança de quem foi e não volta. De quem amou e agora se basta. O coração que antes pulsava seu nome agora palpita liberdade. A alma que te esperava nas madrugadas agora dança com o vento sem rumo, sem amarras, livre. E se há ainda algo de você em mim, é só a lembrança do que não quero mais ser. A memória de um amor que me traiu com o silêncio, com a negligência, com o desprezo embalado em gentileza. Você enxovalhou meu coração com uma harmonia falsa, com promessas costuradas em mentiras. E agora eu reescrevo meus dias com mãos firmes e olhos abertos. Não te odeio. De modo algum te amo. Em nenhum momento te quero. O que mora em mim agora é o eco da dor que me despertou, é a vingança mansa de quem sobreviveu. De quem amou e aprendeu a amar a si mesmo mais.

 

Nas masmorras do amor.

Nas masmorras do amor, sem correntes nem grades, mas com o peso do mundo em cada lembrança habito os corredores escuros da saudade, como quem cumpre pena por crer na esperança. Fui réu confesso dos sonhos que tivemos julgado pelo tempo e condenado à solidão. As promessas que fizemos já nem sei se as dissemos ecoam vazias no cárcere do coração. A vida, essa juíza impiedosa, revisitou o que o desejo ocultou. Em teus olhos vi a alvorada mais formosa, mas era ilusão: a noite nunca passou. Lembro-me de ti em cada esquina do dia, em cada sombra que o sol projeta no chão, em cada rosto, em cada melodia, tua ausência ressoa como um trovão. E então te vejo entre mil rostos perdidos, como se o destino zombasse de mim. Caminhas tranquila, passos bem definidos e eu prisioneiro, sem começo, meio ou fim. Tu cruzas a rua, tua silhueta, poesia viva, o vento brinca com teus cabelos como antes. Meu peito se agita, a lembrança é nociva como vinhos antigos, amargos e cortantes. Finges desejo com um olhar que me atravessa. Ofereces-te os lábios veneno em tentação. Mas é teatro teu gesto logo se dispersa, e cruzas para o outro lado sem dar explicação. Finges não me ver. És atriz da indiferença. E eu, coadjuvante do amor que não venceu, sinto a dor calada da tua presença e a ausência gritante do que nunca foi meu. Oh, doce engano moldado em teu sorriso! Quantas noites eu vaguei buscando abrigo, pensando no toque, no beijo, no aviso de que talvez nunca estiveres comigo. A vida segue cruel, sem rima nem razão, mas sigo também, mesmo sem direção. Pois quem ama demais, não perde a paixão, apenas aprende a conviver com a prisão. E nos calabouços do amor sigo a viver com a chave da liberdade no passado. Teu nome tatuado em meu próprio sofrer, teu rosto nos muros do sonho trancado. Mas que seja assim, se assim tiver de ser, pois mesmo na dor teu rastro é calor. E mesmo fingindo não mais me ver, ainda te amo com todo rancor e amor.

 

sexta-feira, 5 de setembro de 2025

Quando a saudade chegou sem avisar.

Não mais que de repente ela foi embora. Estaqueou meu coração sem aviso, sem alarde, sem tempo para entender o que estava por vir. Apenas virou as costas e levou com ela tudo que fazia sentido: a rotina, a calma, o calor da presença. Deixou o silêncio. Um mistério que grita que pesa que machuca. Naquele instante meu coração parou. Desalinhou-se como quem leva um golpe e não entende de onde veio. E junto com ele caiu meu orgulho, esse muro tolo que construí para esconder o que sentia. Foi só quando ela se foi que eu vi com clareza: eu não era nada sem ela. Nada além de um corpo vagando por aí, tentando fingir força onde só existia vazio. A saudade não pediu licença. Entrou feito vento forte, bagunçando tudo por dentro. Tomou conta dos lugares mais íntimos, do travesseiro ao pensamento. Ela está na caneca de café que uso na minha predileta música que ela cantava baixinho na porta que não se fecha mais com o mesmo som. É nessas pequenas coisas que a ausência se faz presente. É ali que dói mais. E eu, que acreditava ser inteiro, descobri que era ela quem me completava. Era a voz dela que acalmava minha pressa, o olhar dela que me trazia de volta quando eu me perdia de mim mesmo. Era a presença dela que dava sentido aos meus dias comuns. Agora tudo é pausa. Tudo é espera. Tudo é lembrança. Dizem por aí que o tempo cura tudo. Mas ninguém fala do que ele não leva embora. O tempo passa, sim, mas a saudade fica. Fica como marca, como sombra, como eco. E mesmo que a dor um dia diminua, ela nunca desaparece completamente. Porque o que é verdadeiro não se apaga: transforma-se em memória. E é assim que sigo: lembrando: sentindo sobrevivendo à sua fragmentada ausência, um dia de cada vez.

Talvez eu não aprenda a viver sem ela, uma luz no meu caminho.
Mas, habitualmente e hoje, como sempre eu só aprendi a sentir a falta.
E lembrar-me dela exaustivamente, mesmo que me doa ainda é a forma mais bonita que encontrei de não deixá-la partir por completo.

Nada além de poeira

Lá, deitado na maca, com os olhos presos no teto sem cor, compreendi o que tantos já disseram, mas poucos de fato sentem: somos poeira. Pequenos demais para tanta arrogância. Insignificantes demais para tanto orgulho. Em menos de três minutos, a anestesia me levou. Um apagão suave, inevitável. Mas antes disso, ainda lúcido, senti um silêncio que não vinha de fora, mas de dentro. Um silêncio que desmonta e revela. Ali, naquele instante em que a consciência se esvai, tudo o que construímos para parecer fortes se dissolve. O autoritarismo se cala. A soberba perde o fôlego. Os títulos, as certezas, as máscaras, todos ficam do lado de fora da sala. Dentro só resta o frágil ser humano, entregue e vulnerável. Não somos nada. E, paradoxalmente, talvez seja exatamente aí que mora alguma verdade. Não no poder, mas na entrega. Não na força, mas na aceitação da nossa finitude. É estranho pensar que, para muitos, essa percepção só vem quando estamos deitados, imobilizados, prestes a adormecer diante de mãos desconhecidas. Mas talvez seja assim mesmo. Só nos damos conta da nossa pequenez quando não temos mais como fingir que somos grandes. No fim, somos poeira. Mas também somos consciência. E às vezes perceber isso já basta. 

Intuição, Inocência e Fé.

Não abandone suas três grandes e inabaláveis amigas: a Intuição, a Inocência e a Fé. Ao longo da vida, somos ensinados a acumular conhecimento, desenvolver habilidades, cultivar experiências e buscar certezas. Mas, curiosamente, quanto mais crescemos, mais nos afastamos de três presenças silenciosas e poderosas que estiveram conosco desde o início: a Intuição, a Inocência e a . Essas três amigas não gritam, não disputam espaço, não exigem explicações. Elas apenas esperam com paciência que voltemos para casa para dentro de nós mesmos. A Intuição: a sabedoria que não precisa de palavras À Intuição é aquela voz que sussurra antes que a mente formule argumentos. Ela é o pressentimento, o arrepio, o caminho que parece certo mesmo sem lógica aparente. Não é superstição, tampouco impulso vazio. É sabedoria antiga que se manifesta sem pedir licença. Num mundo onde tudo precisa ser provado, medido, calculado, a intuição é muitas vezes desacreditada. No entanto, quantas vezes já nos arrependemos por não tê-la escutado? Ela percebe o que os olhos não veem, sente o que as palavras não dizem. Ignorá-la é como tapar os ouvidos para um conselho vindo do nosso eu mais profundo. Manter a amizade com a intuição é manter o canal aberto com o invisível, com o que está além da razão e muitas vezes é lá que mora a verdade. A Inocência: a pureza que enxerga com o coração A inocência não é tolice, não é ignorância. É a capacidade de ver o mundo com olhos limpos, sem cinismo, sem o peso das decepções. É a criança que ainda vive em nós, acreditando no bem, na beleza, no recomeço. Na pressa de crescer, trocamos a inocência pela desconfiança, como se fosse sinal de maturidade suspeitar de tudo e de todos. Mas o cético excessivo raramente encontra paz. Já o inocente, aquele que ainda consegue se maravilhar com a vida, experimenta um tipo de alegria que não se compra nem se ensina: apenas se sente. Conservar a inocência é manter viva a sensibilidade, a empatia, a esperança. Ela nos protege do endurecimento da alma, do olhar amargo. É ela que nos permite amar de novo, confiar de novo, começar de novo. A Fé: o sustento invisível nos dias escuros À fé é a chama que não se apaga mesmo quando tudo ao redor escurece. Não importa em que ou em quem você acredita o essencial é que você acredite. Ter fé é seguir andando mesmo sem saber o que vem depois da curva. É confiar que há sentido mesmo quando tudo parece sem modo algum. A fé não precisa de prova, ela é a prova. Em tempos de dúvida, crise, perda ou solidão, é ela que nos mantém de pé. Enquanto o medo paralisa, a fé impulsiona. Enquanto a razão limita, a fé expande. Fé é resistência. É ponte entre o finito e o eterno. É a certeza de que, mesmo no caos, existe uma ordem maior agindo em silêncio. Não as abandone. Nunca. A intuição, a inocência e a fé não são luxos espirituais são ferramentas de sobrevivência da alma. São raízes que nos mantêm conectados ao essencial quando tudo o mais nos afasta de nós mesmos. Quando o mundo te fizer duvidar de tudo, que você ainda se lembre de ouvir a intuição, de preservar a inocência e de cultivar a fé. Elas caminham com você desde o berço. E, se você se permitir elas as acompanharão até o fim como grandes e resolutas amigas.

 

quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Nada é eterno.

A vida é feita de ciclos, alegrias e dores, encontros e despedidas, começos e finais. Tudo passa. Essa frase aparentemente simples carrega um peso imenso de sabedoria. Ela é um lembrete silencioso de que nada é eterno, nem o sofrimento nem a felicidade. Tudo está em constante movimento, como um rio que nunca volta ao mesmo ponto. Vivemos buscando estabilidade, como se fosse possível congelar o tempo nos momentos bons ou acelerar os ruins. Mas a verdade é que não temos controle sobre o tempo nem sobre muitas das coisas que acontecem conosco. Podemos apenas viver cada momento com consciência de que ele é único e passageiro. Quando entendemos que tudo passa, começamos a valorizar mais o agora e também a ter mais paciência com as dificuldades. Nos dias bons, lembrar que tudo passa é um convite à gratidão. É perceber que a felicidade não é garantida e por isso mesmo deve ser celebrada. Devemos rir mais, abraçar mais, sermos mais presentes. Aproveitar cada sorriso, cada conquista, cada manhã de sol, porque até mesmo os momentos mais belos irão partir e tudo o que ficará será a memória de como os vivemos. Nos dias ruins, lembrar que tudo passa é um alívio. É um consolo. É saber que a dor tem prazo de validade, mesmo que agora pareça infinita. Corações partidos cicatrizam. Feridas fecham. Lutos se transformam em saudade serena. Ninguém sofre para sempre, e mesmo que a dor não desapareça por completo, ela muda de forma. A tempestade acalma, o céu escurecido volta a se abrir. Tudo passa inclusive o desespero. "Isso também passará", dizem muitas tradições espirituais como um mantra contra a arrogância e o desespero. Se estivermos em cima, devemos lembrar que isso pode mudar então sejamos humildes. Se permanecermos embaixo, devemos lembrar que a vida segue então vivamos fortes. Tudo é temporário e essa consciência nos convida à resiliência, à fé e ao equilíbrio. As estações mudam, os ciclos viram, as pessoas mudam, nós mudamos. Aquilo que hoje parece insuportável amanhã pode não ter mais importância. O que hoje nos aflige pode ser à base do nosso crescimento. Às vezes, a vida nos tira algo não por crueldade, mas porque já é hora de seguir adiante. Dói, mas passa. Aceitar que tudo passa é também aprender a soltar, desprender a necessidade de controle, soltar o que não volta mais, soltar o que nos prende. Quando soltamos, abrimos espaço para o novo. E a vida está cheia de recomeços disfarçados de finais. Cada perda carrega uma semente de transformação. Cada fim esconde um novo início. Por isso, não se desespere nas horas difíceis. Respire fundo. Caminhe um passo de cada vez. Não se apegue ao que machuca, e também não tente segurar o que precisa ir. Confie na impermanência como uma aliada. Porque, no fim das contas, a verdade mais simples e poderosa é essa: Não somos eternos, tudo passa, tudo acaba.

 

Um dia especial de superação, esperança e celebração.

Hoje foi um dia especial, marcado por sentimentos profundos, desafios pessoais e, acima de tudo, gratidão. Acordei cedo, acompanhado do cuidado e apoio do meu filho Augustus, que me levou ao INCA, o Instituto Nacional de Câncer, para realizar uma biópsia da próstata. Há cerca de vinte e cinco dias, durante uma consulta de rotina, o urologista detectou um nódulo na minha próstata. Foi um momento de surpresa, expectativa e apreensão que desencadeou uma série de exames e encaminhamentos. O INCA, sendo uma referência nacional em diagnósticos e tratamentos oncológicos, tornou-se o cenário deste capítulo da minha vida. Entre os exames solicitados, a ressonância magnética multiparamétrica da próstata se destacou como peça central no processo de investigação. Foram dias de espera ansiosa que testaram minha paciência e serenidade. Quando finalmente recebi o laudo, senti um grande conforto: o exame não indicava sinais da doença. Apesar do resultado tranquilizador, segui com a biópsia como medida de segurança e confirmação. O procedimento ocorreu hoje. Fui sedado e após a biópsia, acordei ainda um pouco sonolento, sob os cuidados atenciosos da equipe médica. Após um pequeno lanche e as instruções de pós-operatório Augustus me trouxe de volta para casa. Passei à tarde em repouso, dormindo profundamente e logicamente aliviado por efeito da anestesia. Coincidentemente, hoje também é um marco pessoal significativo: Tania e eu completamos cinquenta e quatro anos de casamento. ‘Bodas de Niquel’.  A data, que merecia celebração plena, quase passou despercebida diante dos acontecimentos do dia. Ainda assim, há beleza no fato de termos atravessado mais este momento juntos, como temos feito há mais de meio século, com filhos encaminhados e netos em formação, além da notícia de mais um membro da família. Seremos bisavós. Apesar de ter recebido do médico um atestado de cinco dias para repouso, sinto-me confiante de que no sábado já estarei de volta à administração do condomínio, onde exerço a função de síndico. Tenho um compromisso profundo com a transparência e a responsabilidade na gestão e sei que esse trabalho também me fortalece, dando sentido ao meu cotidiano. Encerro este dia com o coração tranquilo. A saúde está sendo cuidada, a família está ao meu lado e sigo confiante de que estou no caminho certo. Que venham os próximos dias e bodas com serenidade, fé e disposição renovada.

domingo, 31 de agosto de 2025

O encanto e o limite.

De repente, o olhar se perde. Há um brilho, uma presença, um perfume discreto que invade a alma. O coração se move como se tivesse encontrado no rosto alheio o reflexo de um sonho. É humano encantar-se, é natural admirar a beleza que Deus espalhou pelo mundo. Mas logo, como um sopro de consciência, surge a lembrança: Não cobiçarás a mulher do teu próximo. O mandamento não cai como peso, mas como guia, aos homens despojados dessa ideia. Um alerta suave aos desavisados. Ele recorda que o encanto não é posse, que a beleza não é convite e que o desejo, se nutrido sem freio, pode envenenar a alma. Há mulheres que florescem em jardins já cuidados, corações que batem sob alianças e promessas. Tocar esse solo seria profanar não apenas uma união, mas também a essência de quem deseja. Então, o homem que se vê diante do encanto precisa aprender a transformar sua chama e seus pensamentos. Em vez de cobiça, a admiração. Em vez de desejo, o respeito. Em vez de apropriação, o silêncio e a distância. Porque o verdadeiro amor, ainda que guardado em segredo, não busca destruir, mas preservar. A grandeza não está em ceder à tentação, mas em erguer-se diante dela com a serenidade de quem compreende: nem tudo o que encanta deve ser tomado. Assim o coração se purifica. E aquilo que poderia ser tropeço torna-se lição, torna-se oração, torna-se força. E o homem em paz consigo e com Deus, entende que o encanto foi apenas um espelho mostrando-lhe que a beleza existe, mas que a fidelidade é maior que qualquer desejo e mais luminosa que o amargor da sinceridade.

 

 

Primavera em forma de mulher.

 De repente tudo virou desencanto. Não houve anúncio nem aviso nos céus, apenas um sopro pesado que apagou a chama do que antes parecia eterno. As folhas murcharam e sua cor, outrora vibrante, perdeu-se no tom amarelado do fim. O solo, agora coberto de memórias secas, já não acolhe a vida, mas apenas o rastro do que já floresceu. Os passarinhos calaram-se. O canto que preenchia a manhã foi engolido por um silêncio profundo que ecoa mais alto que qualquer grito. Não há música, não há melodia apenas a ausência que pesa no peito como pedra. O vento extenuado já não sopra como antes. Toca o rosto de forma fria e não tem mais forças para espalhar as folhas mortas ao chão. Até ele se rendeu ao cansaço do tempo. E dentro de mim uma tristeza enorme se ergue. Não é apenas o pranto de um instante, mas uma sombra que se alastra, tomando cada espaço do coração. O desencanto chega como um inverno que se prolonga, gelando as raízes, adormecendo a esperança. Não é feito de um único motivo, mas de pequenos nadas acumulados. Sonhos que se perderam, promessas que não vingaram caminhos que não se cumpriram. O mundo que antes era feito de cores, agora veste tons cinzentos. Os dias se arrastam como se fossem todos iguais e até a memória parece estafada de recordar o que já foi bonito. O tempo implacável parece ter parado apenas para mostrar o quanto a vida pode ser árida. Mas ainda assim, em meio ao silêncio e às folhas mortas, sinto uma leve teimosia da alma. Algo que insiste em não sucumbir totalmente. Talvez o desencanto seja apenas o intervalo antes do renascimento. Ocasionalmente, seja necessário aceitar o silêncio para um dia voltar a ouvir o canto. Eventualmente seja preciso encarar o frio para reconhecer o valor do calor. Tudo agora é tristeza. É verdade. Mas até o desconsolo, como as estações, passa. E mesmo que hoje o vento não consiga levar embora as folhas mortas, virá o dia em que ele trará de volta o perfume da primavera. E então, quando tudo parecia perdido, ela surgiu. Uma mulher caminhando como quem traz consigo a promessa da primavera. Seu olhar era claridade, sua voz era canto, seus passos espalhavam flores invisíveis pelo caminho. O vento, que já não tinha forças, ergueu-se em reverência ao toque de sua presença. Os pássaros, antes emudecidos, encontraram nela a coragem para voltar a cantar. Ela não trouxe apenas o perfume da estação. Trouxe a certeza de que a vida sempre recomeça. Que o desencanto é apenas um véu passageiro e que no coração de quem insiste em esperar, a primavera sempre retorna. E assim, diante dela, compreendi: nenhuma tristeza é eterna quando o amor veste o rosto da primavera.

 

 


A calúnia como refúgio dos fracos.

Vivemos em um tempo em que o debate deveria ser uma ponte entre opiniões diferentes, mas muitas vezes ele se transforma em um campo de ataques. Quando alguém não tem mais argumentos, infelizmente recorre à calúnia. E isso diz muito. Caluniar é acusar sem provas, espalhar mentiras ou tentar sujar a imagem de quem pensa diferente. É o que acontece quando a razão falha e só resta o ataque. É como se, por não conseguir vencer na base da lógica, a pessoa tentasse destruir o outro com palavras falsas. Nas redes sociais, isso se tornou ainda mais comum. Em vez de conversar, muitos preferem atacar. Isso afasta a discussão verdadeira e cria medo nas pessoas de se expressarem, porque ninguém quer virar alvo de mentira, ódio ou cancelamento. Mas a verdade é que quem precisa difamar já perdeu o debate há muito tempo. Vence mesmo quem sabe argumentar com respeito, com dados, com calma. E, principalmente, quem sabe ouvir. Se quisermos uma sociedade mais justa, mais inteligente e mais ética, precisamos aprender a discutir sem destruir. Porque no fim das contas, quem escolhe a desonra mostra que não tem razão nem coragem para encarar a verdade.

 

À nossa filha Glaucia, irmã, sobrinhos, e futura ‘tivó’, não tão distante assim.

 No dia 1º de setembro de 1973, você chegou ao mundo trazendo consigo uma luz diferente, um brilho que desde cedo iluminou nossas vidas e aqueceu nossos corações. Aquele dia marcou o início de uma linda história. A sua biografia. E desde então, todos que a acompanham de perto sabem o quanto você é especial. Você cresceu em meio à nossa família, cercada de amor, cuidado e também de desafios. Cada fase da sua vida foi escrita com coragem e determinação. Você nunca teve as coisas fáceis. Você enfrentou sempre percalços, quedas, dúvidas e até momentos em que tudo parecia difícil demais, mas nunca, jamais mesmo desistiu. E isso é o que mais nos emociona: a sua força! Você se tornou uma mulher guerreira, dessas raras de encontrar. Você competiu com os obstáculos de frente, cabeça erguida, coração firme e fé no amanhã. E como venceu! Hoje você vive na Suíça, ao lado do seu marido, fruto das escolhas que fez com consciência e coragem. Mas, mais do que onde você mora, o que importa é o que você construiu: uma vida digna, sólida, cheia de valores e afeto. Você venceu pela força do trabalho, pela sua seriedade e, principalmente, por ser verdadeira com quem você é. Apesar da distância, nunca deixou de ser presente. Você sempre esteve com a gente na forma virtual, quase que diariamente, em pensamento, em atitudes, em gestos de carinho, nas mensagens escritas e auditivas, nas palavras certas, na hora certa. Sempre atenta aos seus pais, aos seus irmãos, àqueles que fazem parte da sua história. Você nunca se esqueceu de onde veio e isso diz muito sobre o seu caráter. A família, para você, sempre foi e continua sendo o mais importante. E nós, seus pais e irmãos, sentimos um orgulho que não cabe no peito. Orgulho da mulher que você se tornou. Orgulho da filha que nunca deixou de estender a mão. Da irmã que sempre ouve, acolhe, dá conselhos, compartilha momentos, mesmo que à distância. Orgulho da sua jornada, uma caminhada construída com suor, amor e fé por seu amadurecimento, Glaucia. E hoje compreende com clareza uma das maiores verdades da existência: que a vida com tudo o que traz as dores e alegrias, perdas e conquistas. É, ainda assim, o maior presente que podemos receber. E você sabe valorizá-la. Sabe viver com leveza, com sabedoria, com gratidão. Seus pais te amam profundamente. E seus irmãos te admiram mais do que as palavras conseguem expressar. Você é um elo forte na nossa família. Um exemplo de superação, de bondade, de cuidado. O que você construiu em si mesma vale mais do que qualquer medalha: você se tornou uma mulher admirável. E mais do que isso: uma pessoa boa, humana, afetuosa, que toca a vida dos outros com gestos simples e verdadeiros. Neste novo ciclo, desejamos que o amor te acompanhe todos os dias. Que você continue a trilhar caminhos de paz, que nunca te falte saúde, que sua fé permaneça firme e que você siga sendo essa filha maravilhosa, essa irmã querida e essa mulher forte que tanto nos orgulha. Receba, mesmo à distância, o nosso abraço mais apertado e o nosso amor mais sincero. Que o dia 1º de setembro nunca passe despercebido, pois foi o dia em que o mundo ficou melhor só por ter recebido você. Com todo o seu amor, seus pais e seus irmãos.

domingo, 17 de agosto de 2025

As notas musicais, nas calçadas de Vila Isabel.

Vila Isabel, bairro carioca de alma e coração, é um lugar onde a história da música se mistura com o ritmo da vida cotidiana. As calçadas dessa região, embora simples à primeira vista, guardam em cada pedra o eco das melodias que marcaram uma era. As notas musicais, imortalizadas nas canções de Noel Rosa, transcendem o papel e se fazem presentes nas ruas, nas esquinas e nas lembranças que perpassam a memória coletiva. Noel Rosa, filho de Vila Isabel, tornou-se um dos maiores compositores da música brasileira, e sua obra reverbera até hoje como um símbolo de autenticidade, poesia e crítica social. Ele nasceu no bairro e fez dele o cenário de suas histórias e canções, tornando Vila Isabel um reduto de samba e melodia. Suas letras, com humor e ironia, pintam quadros da vida carioca, traduzindo com maestria a dor e a alegria do povo brasileiro. Quando alguém caminha pelas calçadas de Vila Isabel, é quase possível ouvir as notas de “Feitiço da Vila” ou de “Com Que Roupa?”. As canções de Noel, que falam tanto de amor, saudade e das coisas simples do cotidiano, estão impregnadas no ar. Cada esquina carrega uma melodia, e cada rua parece ter seu próprio ritmo, como se os próprios calçadões fossem um reflexo da alma de Noel, personificando o samba em suas mais diversas formas. Ao contrário do que muitas pessoas possam imaginar, as notas musicais das calçadas de Vila Isabel não são de papel. Elas não se limitam a partituras esquecidas em gavetas ou aos registros em discos de vinil. Elas são de vida. Elas dançam no compasso dos passos dos que por ali circulam, nos acordes que saem dos bares e das praças, nas rodas de samba e nas memórias dos que foram e dos que vieram depois. Em cada verso, a arte de Noel se materializa nas ruas. O samba, que foi sua assinatura, encontra eco nas palmas e nas vozes daqueles que, com sua energia contagiante, continuam a celebrar sua obra. A Vila, com suas raízes profundas na música popular, transforma-se numa homenagem viva ao legado do sambista. Seus moradores e visitantes não apenas convivem com a história, mas a respiram a cada dia, como se fossem parte da própria melodia que ele criou. Portanto, as notas musicais de Vila Isabel são eternas e imortais. Elas são a trilha sonora de uma cidade que nunca esquece suas origens, que faz do samba sua maior expressão cultural e que mantém vivos, até hoje, os acordes que Noel Rosa fez nascer ali, em cada canto da sua terra natal.

quinta-feira, 14 de agosto de 2025

O destino e as escolhas de um amor

     

No firmamento existem estrelas cintilantes, mas seus olhos... ah, seus olhos! Sempre flamejantes! Guardam segredos que o céu não ousa ter um universo inteiro num simples olhar de você. Há um sol que se curva ao lhe ver passar e um tempo que para só pra lhe escutar. Você é poesia que respira e caminha, ímã mulher que magnetiza, que o mundo sozinha aninha. Mesmo amada, mesmo entregue e jurada a vida inteira ainda não lhe diz nada. Pois em você mora algo que escapa à razão, um perfume de alma, um toque em oração. E eu que apenas contemplo em silêncio profundo, me rendo à beleza que move seu mundo. Não pra possuir, nem pra desalinhar, mas pra lhe escrever... e lhe eternizar.

Amor! O sangue que corre em mim.

O sangue que corre nas minhas veias carrega mais do que vida, te transporta. Corre com a pressa de um beijo esperado, com a calma de um abraço demorado, com o brilho sereno do teu olhar. Cada batida do meu coração é um poema sussurrado em silêncio. É teu nome escrito nas entrelinhas do meu corpo. É que o amor mora em mim como se sempre tivesse sido lar. Nas veias ele dança feito promessa eterna, feito lembrança doce de um toque que ficou. Meu sangue te conhece. Sabe o caminho do teu riso, o som da tua ausência, o perfume do teu afeto. E mesmo quando não estás, tu vives aqui no pulsar calmo e certo de quem ama por inteiro, sem medida, sem razão. Porque te amar é tão natural quanto respirar, tão vital quanto o sangue que  insiste em me lembrar: sou teu, mesmo sabendo que não és minha.