domingo, 31 de agosto de 2025

O encanto e o limite.

De repente, o olhar se perde. Há um brilho, uma presença, um perfume discreto que invade a alma. O coração se move como se tivesse encontrado no rosto alheio o reflexo de um sonho. É humano encantar-se, é natural admirar a beleza que Deus espalhou pelo mundo. Mas logo, como um sopro de consciência, surge a lembrança: Não cobiçarás a mulher do teu próximo. O mandamento não cai como peso, mas como guia, aos homens despojados dessa ideia. Um alerta suave aos desavisados. Ele recorda que o encanto não é posse, que a beleza não é convite e que o desejo, se nutrido sem freio, pode envenenar a alma. Há mulheres que florescem em jardins já cuidados, corações que batem sob alianças e promessas. Tocar esse solo seria profanar não apenas uma união, mas também a essência de quem deseja. Então, o homem que se vê diante do encanto precisa aprender a transformar sua chama e seus pensamentos. Em vez de cobiça, a admiração. Em vez de desejo, o respeito. Em vez de apropriação, o silêncio e a distância. Porque o verdadeiro amor, ainda que guardado em segredo, não busca destruir, mas preservar. A grandeza não está em ceder à tentação, mas em erguer-se diante dela com a serenidade de quem compreende: nem tudo o que encanta deve ser tomado. Assim o coração se purifica. E aquilo que poderia ser tropeço torna-se lição, torna-se oração, torna-se força. E o homem em paz consigo e com Deus, entende que o encanto foi apenas um espelho mostrando-lhe que a beleza existe, mas que a fidelidade é maior que qualquer desejo e mais luminosa que o amargor da sinceridade.

 

 

Primavera em forma de mulher.

 De repente tudo virou desencanto. Não houve anúncio nem aviso nos céus, apenas um sopro pesado que apagou a chama do que antes parecia eterno. As folhas murcharam e sua cor, outrora vibrante, perdeu-se no tom amarelado do fim. O solo, agora coberto de memórias secas, já não acolhe a vida, mas apenas o rastro do que já floresceu. Os passarinhos calaram-se. O canto que preenchia a manhã foi engolido por um silêncio profundo que ecoa mais alto que qualquer grito. Não há música, não há melodia apenas a ausência que pesa no peito como pedra. O vento extenuado já não sopra como antes. Toca o rosto de forma fria e não tem mais forças para espalhar as folhas mortas ao chão. Até ele se rendeu ao cansaço do tempo. E dentro de mim uma tristeza enorme se ergue. Não é apenas o pranto de um instante, mas uma sombra que se alastra, tomando cada espaço do coração. O desencanto chega como um inverno que se prolonga, gelando as raízes, adormecendo a esperança. Não é feito de um único motivo, mas de pequenos nadas acumulados. Sonhos que se perderam, promessas que não vingaram caminhos que não se cumpriram. O mundo que antes era feito de cores, agora veste tons cinzentos. Os dias se arrastam como se fossem todos iguais e até a memória parece estafada de recordar o que já foi bonito. O tempo implacável parece ter parado apenas para mostrar o quanto a vida pode ser árida. Mas ainda assim, em meio ao silêncio e às folhas mortas, sinto uma leve teimosia da alma. Algo que insiste em não sucumbir totalmente. Talvez o desencanto seja apenas o intervalo antes do renascimento. Ocasionalmente, seja necessário aceitar o silêncio para um dia voltar a ouvir o canto. Eventualmente seja preciso encarar o frio para reconhecer o valor do calor. Tudo agora é tristeza. É verdade. Mas até o desconsolo, como as estações, passa. E mesmo que hoje o vento não consiga levar embora as folhas mortas, virá o dia em que ele trará de volta o perfume da primavera. E então, quando tudo parecia perdido, ela surgiu. Uma mulher caminhando como quem traz consigo a promessa da primavera. Seu olhar era claridade, sua voz era canto, seus passos espalhavam flores invisíveis pelo caminho. O vento, que já não tinha forças, ergueu-se em reverência ao toque de sua presença. Os pássaros, antes emudecidos, encontraram nela a coragem para voltar a cantar. Ela não trouxe apenas o perfume da estação. Trouxe a certeza de que a vida sempre recomeça. Que o desencanto é apenas um véu passageiro e que no coração de quem insiste em esperar, a primavera sempre retorna. E assim, diante dela, compreendi: nenhuma tristeza é eterna quando o amor veste o rosto da primavera.

 

 


A calúnia como refúgio dos fracos.

Vivemos em um tempo em que o debate deveria ser uma ponte entre opiniões diferentes, mas muitas vezes ele se transforma em um campo de ataques. Quando alguém não tem mais argumentos, infelizmente recorre à calúnia. E isso diz muito. Caluniar é acusar sem provas, espalhar mentiras ou tentar sujar a imagem de quem pensa diferente. É o que acontece quando a razão falha e só resta o ataque. É como se, por não conseguir vencer na base da lógica, a pessoa tentasse destruir o outro com palavras falsas. Nas redes sociais, isso se tornou ainda mais comum. Em vez de conversar, muitos preferem atacar. Isso afasta a discussão verdadeira e cria medo nas pessoas de se expressarem, porque ninguém quer virar alvo de mentira, ódio ou cancelamento. Mas a verdade é que quem precisa difamar já perdeu o debate há muito tempo. Vence mesmo quem sabe argumentar com respeito, com dados, com calma. E, principalmente, quem sabe ouvir. Se quisermos uma sociedade mais justa, mais inteligente e mais ética, precisamos aprender a discutir sem destruir. Porque no fim das contas, quem escolhe a desonra mostra que não tem razão nem coragem para encarar a verdade.

 

À nossa filha Glaucia, irmã, sobrinhos, e futura ‘tivó’, não tão distante assim.

 No dia 1º de setembro de 1973, você chegou ao mundo trazendo consigo uma luz diferente, um brilho que desde cedo iluminou nossas vidas e aqueceu nossos corações. Aquele dia marcou o início de uma linda história. A sua biografia. E desde então, todos que a acompanham de perto sabem o quanto você é especial. Você cresceu em meio à nossa família, cercada de amor, cuidado e também de desafios. Cada fase da sua vida foi escrita com coragem e determinação. Você nunca teve as coisas fáceis. Você enfrentou sempre percalços, quedas, dúvidas e até momentos em que tudo parecia difícil demais, mas nunca, jamais mesmo desistiu. E isso é o que mais nos emociona: a sua força! Você se tornou uma mulher guerreira, dessas raras de encontrar. Você competiu com os obstáculos de frente, cabeça erguida, coração firme e fé no amanhã. E como venceu! Hoje você vive na Suíça, ao lado do seu marido, fruto das escolhas que fez com consciência e coragem. Mas, mais do que onde você mora, o que importa é o que você construiu: uma vida digna, sólida, cheia de valores e afeto. Você venceu pela força do trabalho, pela sua seriedade e, principalmente, por ser verdadeira com quem você é. Apesar da distância, nunca deixou de ser presente. Você sempre esteve com a gente na forma virtual, quase que diariamente, em pensamento, em atitudes, em gestos de carinho, nas mensagens escritas e auditivas, nas palavras certas, na hora certa. Sempre atenta aos seus pais, aos seus irmãos, àqueles que fazem parte da sua história. Você nunca se esqueceu de onde veio e isso diz muito sobre o seu caráter. A família, para você, sempre foi e continua sendo o mais importante. E nós, seus pais e irmãos, sentimos um orgulho que não cabe no peito. Orgulho da mulher que você se tornou. Orgulho da filha que nunca deixou de estender a mão. Da irmã que sempre ouve, acolhe, dá conselhos, compartilha momentos, mesmo que à distância. Orgulho da sua jornada, uma caminhada construída com suor, amor e fé por seu amadurecimento, Glaucia. E hoje compreende com clareza uma das maiores verdades da existência: que a vida com tudo o que traz as dores e alegrias, perdas e conquistas. É, ainda assim, o maior presente que podemos receber. E você sabe valorizá-la. Sabe viver com leveza, com sabedoria, com gratidão. Seus pais te amam profundamente. E seus irmãos te admiram mais do que as palavras conseguem expressar. Você é um elo forte na nossa família. Um exemplo de superação, de bondade, de cuidado. O que você construiu em si mesma vale mais do que qualquer medalha: você se tornou uma mulher admirável. E mais do que isso: uma pessoa boa, humana, afetuosa, que toca a vida dos outros com gestos simples e verdadeiros. Neste novo ciclo, desejamos que o amor te acompanhe todos os dias. Que você continue a trilhar caminhos de paz, que nunca te falte saúde, que sua fé permaneça firme e que você siga sendo essa filha maravilhosa, essa irmã querida e essa mulher forte que tanto nos orgulha. Receba, mesmo à distância, o nosso abraço mais apertado e o nosso amor mais sincero. Que o dia 1º de setembro nunca passe despercebido, pois foi o dia em que o mundo ficou melhor só por ter recebido você. Com todo o seu amor, seus pais e seus irmãos.

domingo, 17 de agosto de 2025

As notas musicais, nas calçadas de Vila Isabel.

Vila Isabel, bairro carioca de alma e coração, é um lugar onde a história da música se mistura com o ritmo da vida cotidiana. As calçadas dessa região, embora simples à primeira vista, guardam em cada pedra o eco das melodias que marcaram uma era. As notas musicais, imortalizadas nas canções de Noel Rosa, transcendem o papel e se fazem presentes nas ruas, nas esquinas e nas lembranças que perpassam a memória coletiva. Noel Rosa, filho de Vila Isabel, tornou-se um dos maiores compositores da música brasileira, e sua obra reverbera até hoje como um símbolo de autenticidade, poesia e crítica social. Ele nasceu no bairro e fez dele o cenário de suas histórias e canções, tornando Vila Isabel um reduto de samba e melodia. Suas letras, com humor e ironia, pintam quadros da vida carioca, traduzindo com maestria a dor e a alegria do povo brasileiro. Quando alguém caminha pelas calçadas de Vila Isabel, é quase possível ouvir as notas de “Feitiço da Vila” ou de “Com Que Roupa?”. As canções de Noel, que falam tanto de amor, saudade e das coisas simples do cotidiano, estão impregnadas no ar. Cada esquina carrega uma melodia, e cada rua parece ter seu próprio ritmo, como se os próprios calçadões fossem um reflexo da alma de Noel, personificando o samba em suas mais diversas formas. Ao contrário do que muitas pessoas possam imaginar, as notas musicais das calçadas de Vila Isabel não são de papel. Elas não se limitam a partituras esquecidas em gavetas ou aos registros em discos de vinil. Elas são de vida. Elas dançam no compasso dos passos dos que por ali circulam, nos acordes que saem dos bares e das praças, nas rodas de samba e nas memórias dos que foram e dos que vieram depois. Em cada verso, a arte de Noel se materializa nas ruas. O samba, que foi sua assinatura, encontra eco nas palmas e nas vozes daqueles que, com sua energia contagiante, continuam a celebrar sua obra. A Vila, com suas raízes profundas na música popular, transforma-se numa homenagem viva ao legado do sambista. Seus moradores e visitantes não apenas convivem com a história, mas a respiram a cada dia, como se fossem parte da própria melodia que ele criou. Portanto, as notas musicais de Vila Isabel são eternas e imortais. Elas são a trilha sonora de uma cidade que nunca esquece suas origens, que faz do samba sua maior expressão cultural e que mantém vivos, até hoje, os acordes que Noel Rosa fez nascer ali, em cada canto da sua terra natal.

quinta-feira, 14 de agosto de 2025

O destino e as escolhas de um amor

     

No firmamento existem estrelas cintilantes, mas seus olhos... ah, seus olhos! Sempre flamejantes! Guardam segredos que o céu não ousa ter um universo inteiro num simples olhar de você. Há um sol que se curva ao lhe ver passar e um tempo que para só pra lhe escutar. Você é poesia que respira e caminha, ímã mulher que magnetiza, que o mundo sozinha aninha. Mesmo amada, mesmo entregue e jurada a vida inteira ainda não lhe diz nada. Pois em você mora algo que escapa à razão, um perfume de alma, um toque em oração. E eu que apenas contemplo em silêncio profundo, me rendo à beleza que move seu mundo. Não pra possuir, nem pra desalinhar, mas pra lhe escrever... e lhe eternizar.

Amor! O sangue que corre em mim.

O sangue que corre nas minhas veias carrega mais do que vida, te transporta. Corre com a pressa de um beijo esperado, com a calma de um abraço demorado, com o brilho sereno do teu olhar. Cada batida do meu coração é um poema sussurrado em silêncio. É teu nome escrito nas entrelinhas do meu corpo. É que o amor mora em mim como se sempre tivesse sido lar. Nas veias ele dança feito promessa eterna, feito lembrança doce de um toque que ficou. Meu sangue te conhece. Sabe o caminho do teu riso, o som da tua ausência, o perfume do teu afeto. E mesmo quando não estás, tu vives aqui no pulsar calmo e certo de quem ama por inteiro, sem medida, sem razão. Porque te amar é tão natural quanto respirar, tão vital quanto o sangue que  insiste em me lembrar: sou teu, mesmo sabendo que não és minha. 

terça-feira, 12 de agosto de 2025

O Sabido Muda de Ideia, o Ignorante Busca Desculpas.

Mudar de ideia é, muitas vezes, visto como fraqueza por aqueles que não compreendem o valor do conhecimento em constante evolução. No entanto, é justamente na capacidade de repensar, reavaliar e reconhecer enganos que mora a verdadeira sabedoria. O sábio não é aquele que está sempre certo, mas aquele que, diante de novos argumentos, novas informações ou novas experiências, tem a humildade e a coragem de dizer: “eu estava errado”. Por outro lado, o ignorante, não no sentido ofensivo da palavra, mas sim como aquele que se recusa a aprender e encontra mil desculpas para manter sua posição. Justifica sua teimosia com orgulho, se esconde atrás de crenças ultrapassadas ou distorcidas, e rejeita qualquer questionamento como uma ameaça à sua identidade. Ele não busca a verdade; busca apenas estar “certo”, mesmo que isso signifique permanecer no erro. Essa diferença de postura diz muito sobre o caráter e a maturidade de uma pessoa. O gênio entende que o mundo está em constante mudança, e que aprender é um processo contínuo. Sabe que cada pessoa tem algo a ensinar e que mudar de opinião não é sinal de fraqueza, mas sim de evolução. Já o ignorante, por medo ou arrogância, se prende a ideias fixas, tornando-se prisioneiro das próprias limitações. É fácil reconhecer os dois perfis no dia a dia. O sabido ouve, pondera, reflete. Ele aceita críticas e usa o questionamento como uma ferramenta de crescimento. Já o ignorante reage com raiva ou desprezo diante do contraditório, pois para ele, admitir erro é sinal de humilhação, não de amadurecimento. No fim, o caminho da sabedoria exige coragem: coragem para admitir falhas, para recomeçar, para reconstruir pensamentos. Já o caminho da ignorância se alimenta de medo: medo de parecer fraco, de perder status, de sair da zona de conforto. Portanto, se há um traço que diferencia o sábio do ignorante, é a humildade. E, muitas vezes, essa humildade começa justamente na simples, porém poderosa, atitude de mudar de ideia.

sábado, 9 de agosto de 2025

Tua ausência

Às vezes, penso que foste só um suspiro, um sopro breve no véu da existência, então teu nome pulsa em mim, feito oração dita em silêncio, sem fé. Carrego tuas lembranças como cinzas quentes, sem saber se me queimam ou aquecem, e cada gesto meu parece um eco teu, mesmo quando o mundo já te esqueceu. As noites são poços onde mergulho, buscando teu rosto na superfície do escuro, mas só encontro meu reflexo cansado, afogado no mar do que nunca foi. E se a lua brilha, é só para me lembrar do que perdi na curva de um adeus mudo, das palavras que calei por orgulho, e da tua ausência, que agora é tudo.