O meu sonho era conhecer o velho mundo. Eu fui a uma daquelas
ilhas da Europa e arranjei um tipo de hostel, um pouco precário, mas era o
único local de hospedagem. O local era imundo, com muitos insetos que voavam
freneticamente sobre mim. Assinei a lista de hóspedes e por coincidência só
havia assinatura de um cliente, que por acaso, também era brasileiro. No caso,
dois malucos e desbravadores em um lugar inóspito, sem telefone e internet,
somente uma fraca energia elétrica, quase a luz de velas. Lá só havia um sinal
de rádio que se comunicava com outra cidade bem distante, e aquele barulho
agudo do transmissor irritava a qualquer um quando findava o dia. Na parte da
manhã, Geraldo e eu seguíamos as trilhas litorâneas do esplendoroso lugar, sob
o impiedoso sol, cercado de vegetações e frutas de todas as espécies, algumas
nossas já conhecidas. Logicamente nós nos reabastecíamos dessas iguarias e à
noite, nós chegávamos à nossa insatisfatória pocilga, aguardando o almoço-
ajantarado fornecido pelo proprietário do albergue. Decorridos alguns dias, eu
estava dormindo coberto com um edredom, depois de uma forte chuva mudando a
temperatura local, quando fui acordado com um réptil sobre o meu lado esquerdo
do peito. Enquanto a serpente rodilhava no seu local aquecido eu suava e
permanecia imóvel. De vez em quando eu ouvia e sentia o barulho muito sutil
dela mexendo a coberta. Eu chorava por dentro, amaldiçoando a minha viagem.
Quando amanheceu, o meu colega de viagem sentiu a minha falta no café da manhã
e foi ao meu quarto. Quando ele entrou, notou que eu estava totalmente
desesperado, com os olhos arregalados e olhando para o meu peito. Eu abria a
boca e balbuciava a palavra cobra para ele. Em principio, ele ficou perplexo
com a minha situação e foi procurar o estalajadeiro, que prontamente foi ao
quarto para saber detalhadamente o que houvera comigo. Nisso, eles presenciaram
o animal se locomovendo por dentro da coberta e foram correndo ao local onde
ficava o aparelho de rádio, a fim de solicitar um médico, explicando a situação
em que eu me encontrava. Em seguida eles foram informados pelo responsável do
hospital quais seriam a cor e formato do ofídio, a fim de que eles levassem o
soro correto, caso eu fosse mordido. Naquele momento eles não poderiam levantar
a coberta, devido à delicada situação. Isso perdurou por mais longas quatro
horas. Aos poucos eu senti que a víbora começou a locomover-se vagarosamente
sobre o meu corpo, deslizando pela barriga e passando por cima de meus braços
do lado esquerdo, que estavam congelados, pelo pavor. De maneira abrupta, eu
dei um salto para o lado direito da minha cama, como um raio, e consegui
levantar-me sem ser mordido. Incrédulos com a minha iniciativa, e para a nossa
surpresa ao fundo, lá no pé da cama nós ouvimos a palavra saindo da rastejante:
“Geraldo”. Que susto que eu levei. Acho que ela era uma parenta dele.
Esse texto é uma homenagem ao grande humorista Castrinho.
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